sábado, 29 de maio de 2010

Nunca mais


Lanço meu olhar agudo, por velho se sentir, por sobre as coisas e as vejo muito claras agora.

Um olhar diferente sobrevoa a caminhada, sem detalhes, porque nesta hora quero somente pairar, olhar de cima o que aparece e ver quanta importância destaquei aos de menos e não vi o que a mais me ofereciam, por estar cega e envolta na trama do impossível. Presa no sonho, grudada na desatenção do momento presente.

Apequenada na observação percebo que de tudo o que vejo muito tem de nunca mais. De cima consigo enxergar o quanto outra sou e esta me persegue avisando sem parar.

Definitivo e intenso demais para quem está sempre querendo ir além ou onde der para ir.

Todos os depois terão novas cores, iluminando meu pensar, trazendo possibilidades.

E de tanto em tanto vou formatando aquela que serei eu.

Nunca mais.

domingo, 23 de maio de 2010

Nu


Ficar nu em tempos ruins faz um registro na alma de sofrimento e desproteção sem limites.

Desnudados no corpo sentimos a alma indefesa e arrebatamos todas as máscaras e roupagens que usamos para viver nosso dia a dia, como num impulso raivoso.

Despidos de abrigos também nos tornamos um ser sem coragem para conviver com os sentimentos de raiva, ou o inverso, de amor ou o contraponto.

Nus de nós mesmos e gelados frente a vida.

Enfrentar adversidades sem nenhuma arma. Apenas o coração que pulsa fraco, sem nada que o alimente, pois a alma está despida, fria e inerte, por não poder seguir atrás dos sonhos.

A nudez do espírito traz à tona a esperança, porque em sendo nada neste momento temos a alternativa de buscar tudo.

Então, cubra seu corpo nu e encontrarás o fantasma perdido.

sábado, 22 de maio de 2010

Quatro paredes


Quatro paredes nunca contam com o teto e na verdade, o teto é que são elas. O que acontece nos reflexos dos cimentos ao quadrado é o de cima que os vê e é sempre emparedado que enxergamos o que talvez a olho nu e na claridade não conseguiríamos entrever.

É nesta prisão que nos defrontamos com o desconhecido de nós mesmos, pois por ali, não temos para onde correr e de tais partes se formam o viver, este presente sem fuga.

A parede real nos grita as obrigações, os compromissos e os deveres a cumprir como uma ameaça, se não dermos cabo das ditas. Faca no pescoço. Cumpra.

A parede em frente tem a cor da esperança que avisa que o tic-tac do relógio está correndo e alertando que não dispomos de muito mais tempo para sermos felizes ou infelizes, porque na verdade isto é do gosto de cada um. Uns e outros passam a vida no sofrimento por não saberem trilhar o caminho da alegria e da felicidade e escolhem para si o pedregulho, e nunca dele conseguem se safar.

A outra parede em tons de ilusão mostra as impossibilidades da vida de uma forma muito sutil, pois é nesta seara que muitos não alcançam autonomia imaginando simplesmente o que desejam, pressupondo que a solução venha como se uma mágica fosse.

A quarta parede vem nos falar da essência da existência, assoprando desesperançada que a nós é dado o livre arbítrio. Ir e vir faz parte da assombração que idealiza um sentido constante de crescimento e de valorização do que vem por aí. Viver.
E entre estas quatro paredes vemos o “teto” que tudo observa como se Deus fosse.

Para mim, o teto representa o amor. Indiscutível.

Esqueleto


De volta ao esqueleto com milhões de partículas de toda a espécie que se uniram cantareiras e voltaram a envolver meus ossos. Na evolução dos sentidos comecei a pressentir a quentura dos nervos e a musculatura aderindo à minha ossada descarnada. Veias se inchando com sangue quente que recomeça a navegação por entre elas que de tão secas tomam um susto. Mas rápidas se alegram e se refazem, talvez um pouco mal humoradas. Afinal, este corpo estava descansando e lá vem esta tal de vida movimentar o que estava quase morto.

A gritaria entre os átomos é ensurdecedora com meus pensamentos zunindo de um lado a outro, um pouco desprovidos de senso, uma vez que agora procuram acomodar-se nessa carcaça.

Tonta com a potência da história a me empurrar barranca acima, sem dó, meu esqueleto agora revestido de gente decide assumir o que vier.

A renovação deveria ser sempre assim, ruidosa e galopante, sem meias- medidas, anunciando ao mundo que a caveira agora tem dono.

domingo, 16 de maio de 2010

Suspeita


De revés, alongo meu olhar no agora e só enxergo o depois. É sabido que para vivermos plenamente, só o presente momento é o que interessa. Mas a fobia de olhar em frente é sempre minha primeira opção.E a carga do agora para trás faz minhas passadas se tornarem densas, seguidas por um conteúdo que não quer se desligar.

Faço voltas por areias macias, pedregulhos pontudos e águas geladas do mar. Salteio entre fatos e decido seguir sem proteção, descalça, rumando por entre os caminhos da frente e deixando para trás o que eu já vivi. Como deve ser.

Intensidades descartadas na efemeridade de um pensamento.

Lembranças sutis de uma que não era eu.

A dúvida me leva a ponderar o que eu preciso de verdade e o que eu posso dispor ao vento.

E solto as amarras do aditivo que insiste em me perseguir e entendo que o amontoado preso em mim, não me pertence, apesar de querer parecer.

Sem dúvidas, se clareia a caminhada e se alegra o presente com o olho afoito no que há de vir.

Desatino



No disparate vamos indo um pouco sem cabeça para pensar, outro tanto pensando demais. Somos sempre um emaranhado de opções que brigam entre si desatinadas imaginando que dentro deste ardil de ditados alguma coisa irá se sobressair.

O tempo voa, mais não seja para estontear quem quer parar para pensar, o que não é mais possível. O entorno é muito acelerado para ser analisado e a vida vai andando e nos levando no arrasto.

Marionetes do mundo eu diria, sem validade para contrapor o futuro, e sem tempo para vivenciar o que agora se coloca na nossa frente.

Pulamos de atividades no dia como animais fossemos com este pendor. Nos embrulhamos nos galhos da vida e a intercalamos com o vento, a quentura do sol e a suavidade da lua.

Presos nos cordões de quem dá o norte há muito, sacudimos a poeira do viver, imaginando que desta forma ficaremos mais livres e esta alforria poderá nos dar passadas do Pequeno Polegar.

Para onde ir se livres estamos?

domingo, 9 de maio de 2010

Avatar


Vou colocar meu avatar e andar por aí sendo outra. Uma que nunca fui, quem sabe.

Uma nova forma que me deixaria diferente e talvez nem bem do meu agrado só para experimentar como viver em outro corpo ou em outra fantasia.

E, sabe-se lá, atrair alegorias, seres de melhor dimensão, e talvez, menos aflitos amores.

Uma cabeça diferente, com outros pensamentos. Olhares diversos do que estou acostumada a olhar, ouvidos mais sagazes para ouvir o que nem penso em escutar. Viver entre tantos.

Vestimentas que não apontam pra onde vou nem de onde venho mas que apenas me dêem conforto térmico e de movimento.

Mãos hábeis para outras tarefas que não seja bater célere num teclado que já é minha extensão, hoje.

Pernas mais curtas e lentas nas passadas aproveitando outros caminhos, trilhas de menor passagem e desvios não tão radicais.

Este avatar me faria ter menos força de atitude e intensidade e escasso calor humano me colocando tudo de menos.

Sendo outra, e fantasiada, não iria usar as palavras como se minhas fossem e nem a escrita como recados que sequer foram solicitados

Quem sabe uma testa sem pensamento nem fundamento somente existindo se plugada em outras instâncias.

Um ser etéreo, avoado, uma mulher impossível.

sábado, 8 de maio de 2010

Invasão


Se tem uma coisa que a vida moderna nos trouxe é a invasão. Temos os grandes olhos do mundo focados em nós, e, nem que não queiramos, assim é.

Um presente grego da tecnologia que facilita a vida enquanto derruba qualquer tentativa de vivermos ocultos e em paz.

Tantas formas de conexão e tão pouco aproveitáveis por não engrandecer nossas relações porque na verdade nos afasta da palavra, do olhar e do toque.

Um abraço e um beijo são digitáveis e para muitos tem o mesmo valor. Eles vêm enfeitados e coloridos querendo parecer tão deliciosos como se o fossem na realidade.

Carinhos de lábios cheios e abraços de brinquedo surgem a partir de hábeis tecnologias gráficas preenchendo corações solitários. Parece que apenas da máquina surgirão os presentes emotivos que de longe lideram as relações interpessoais de hoje.

Não esquecendo que todas as redes podem ser usadas para chegar até você, mesmo que você não queira. A abordagem aparece através do espaço infinito da tecnologia.

Somos um buraco imenso cavado na internet e por ali embarca o tudo do mundo. Estamos impotentes e entregues e o descarte também pode vir sem aviso prévio, sem bilhete azul.

Hackers da vida de todos.

Parada


Sempre sem aviso, a vida pára. Um breque repentino em que ficamos impossibilitados de seguir em frente. Nem um passo sequer poderemos dar. Estanques e atônitos, impotentes na chamada “correria”.

Nunca estamos preparados suficientemente para enfrentarmos a hora em que apenas a cabeça está funcionando, e mal, digamos assim.

Por um motivo qualquer a programação estabelecida não foi cumprida e descontrolados do rumo, ficamos com pensamentos desfocados, indo e vindo, como animais em jaula procurando uma saída.

É aí que entramos em contatos com a nossa vida de verdade. E percebemos que chegou a hora de pensar melhor. De analisar o entorno e descobrir como e porque chegamos ali.

E então a calmaria se estabelece e iniciamos a delicia de se ver sem controle.

Observar as batidas do coração, o suor frio do susto da parada e os tremores de um corpo acostumado a andar na coleira, como um bicho domesticado.

Devagar, vamos entrando em contato com o eu interior e relaxando no sentido de enxergar melhor a vida em perspectiva e não apenas transitar célere por ela.

A parada vem te avisar que é chegada a hora de voltar.

Regresse um pouco ao tempo e aproveite a virada dos minutos.

Vai valer à pena.

domingo, 2 de maio de 2010

Tempos tecnológicos


Quando a tecnologia falha e me deixa, como uma inválida fosse, fora do ar, sem conexão com o mundo e com meus projetos.

Quando ela me derruba precisamente quando eu mais preciso.

Quando ela me joga ao chão como se eu fosse um ser sem serventia.

Quando ela me faz de boba a encarar olhares incrédulos e irônicos como se eu nada valesse, então penso no passado, por incrível que pareça.

Pois é.

Linkados no rabicho de nossos instrumentos atuais de trabalho nos arrastamos pela via láctea - só pode ser – no infinito onde as correntes fluorescentes do limbo são o que nos traz à terra. Tudo voa por cima da nossa cabeça, e ao olharmos para os ventos no céu, não conseguimos enxergar quem nos aprisiona com tanta propriedade e inteligência.

Não tem poesia nem romance nesta cruzada de fios invisíveis conectados com o impossível. De tão complicado que é, só sabemos que somos reféns. E que sem as máquinas poderosas e céleres que vão aonde vamos, somos ninharia.

E então o passado vem me provocar.

Em que um dia tinha exatamente 24 horas e as primeiras doze horas, pareciam ser um tempo de inúmeras tarefas a cumprir, todas elas com prazo longo para serem executadas e o dia se arrastava lindamente. Não era necessário correr e nada nos deixava na mão, porque tudo estava na mão. Era só trocar uma pilha, repor a fita, trocar a lâmpada, consertar o aparelho.

Nossos passos eram mais comedidos, aproveitando a travessia. Nossos pensamentos eram ordenados com simplicidade de quem tem uma vida inteira para viver. Nossa fome de tudo era moderada. Não lotava nossos estômagos nem nossa mente com excessos. Tudo slim. Já naquele tempo sabíamos precisamente o que significava “slim” - muito antes de chegarmos no agora.

Tempos mais enxutos de tanta coisa a se pensar. Mais magros de alimentos. Mais romances e amores a dar chance. Tempos de poder pensar em refazer tudo ou muito.

Na velocidade da luz, não temos mais tempo.

Por pouco


Nos limiares da alegria e tristeza, por pouco, caímos nas velhas ciladas. Armadilhas que de tão conhecidas por nós estão dilapidadas, mas nunca o suficiente pois aparecem mascaradas de novas. A cabeça na vanguarda dos acontecimentos está alhures, elucubrando sonhos e fantasias a galope.

Disparada geral.

E sem muito cálculo arribamos ao encontro da arapuca abrindo a porteira para a fraude, nossa velha conhecida, disfarçada em sentimentos amáveis.

Até parece.

Nossa consciência, enfim, nos dá o chamado de alerta urgente.

Analise o que está vindo, seja prudente e não entorne o caldo, agora que já aprendeste a degustar.

E então começa a caminhada de volta. Adrenalina sob controle, riso contido, é hora de voltarmos a passagem e discorrermos entre nós. Conversas profícuas estas em que enredamos nós mesmos frente a frente. A discussão vai para um lado e outro, em que cada parte de nossa alma defende o que mais lhe apraz. E talvez o mais belo não seja bom. É apenas uma conhecida vivência de ilusões, promessas, aprisionamento e ansiedade.

Um pote repleto de fantasia e tentação tendo a afeição como recheio irrecusável. Então, uma parte de nós quer andar por ali e a outra quer retroceder.

A nossa dualidade de sentimentos é o que nos movimenta e traz o frescor de decisões acertadas, mesmo no afogadilho das paixões.

Esta foi por pouco!!!!!

sábado, 1 de maio de 2010

Não


Desde pequena a palavrinha NÃO surge na boca das mães e no ouvido das crianças como sendo fundamental. Para o bem ou para o mal e tantas interpretações lhe são conferidas. De sua necessidade de ser dita, da forma como deverá ser pronunciada, quando deverá ser usada e em que tom.

Nossa.

O NÃO tem história mas nada disso se compara ao aprendizado de NEGAR.

Recusar é sempre tirar um pedaço ou nos faltar o mesmo. Ninguém quer ser o maldito que tira, o safado egoísta que quer tudo para si e então, rejeitar algum pedido nos põe em culpa dobrada e de joelhos, quase pedindo perdão.

A renúncia eventual ou diária do nosso dia a dia são pedregulhos a despedaçar nossas passadas. Cuidamos de desviar do termo, cautelosos e vivazes, achando que se sairmos pela tangente, estaremos bem.

Triste engano.

Afastar-se de situações ou pessoas, negando-lhes o que for, muitas e tantas vezes, vem para nos libertar. Afinal nem tudo precisamos fazer e, nos desagrados, melhor puxar o carro, abstraindo de nossa vida o inconveniente.

Então...


O desejo do outro se contrapõe frente às nossas ânsias e é chegada a hora de enfrentarmos nosso medo e romper o impedimento dizendo simplesmente NÃO.

Negar é libertador. Experimente.

Outra


Ser outra sendo a mesma.

Assim acordei hoje. Me olhei e lá estava meu esqueleto recoberto com tudo que é habitual. Mas tinha algo diferente. Um sorriso menor, um pensamento mais quieto. Bom, isso não é normal.

A diferença deve estar no reparo das coisas que me surgem num tamanho desconhecido. Então, o esforço é trazer a dimensão, olhando de esguelha e com cuidado.

E decido seguir assim, diferente, quase uma desconhecida.

Todo mundo gostaria de em dado momento se ignorar girando a piorra ao contrário do que vem rodando.

Beleza pura acordar sendo diversa de todo dia. Talvez quiséssemos acordar mais covardes, mais submissas, menos guerreiras. Bacana ser quase uma gueixa para seu amor, baixando os olhos e andar quase levitando em passinhos suaves. Não levantar a voz, não reclamar de nada, não romper com ninguém, não opinar sobre nenhum assunto. Apenas aceitar.

É a preguiça de ser que me faz pensar.

Porque exausta de bater continência ao destino que toda hora bate na porta e te faz ir em frente. Nossa biografia é incansável e com energia de um exército vai atropelando as mais insignificantes iniciativas tornando-as batalhas vencedoras.

Nem sei mais de onde vem a força. Se de mim ou esta outra aí, que está a me assombrar hoje.

Eu mesma sendo tão diferente.

Abajur



Um abajur diz muito de si quando apagado e mais ainda quando inicia sua vida, aceso. Ilumina pouco o ambiente e quase sempre aquele pedacinho da casa. Sempre muito delicado, tem mil feitios.

Mas, a melhor feição dele é no escurecer em que sua luz se confunde com o crepúsculo e assim ele vai criando suas próprias sombras mescladas com as nuances do cair da noite. Uma luz que termina em outra, tímida, cautelosa, uma penumbra que vem avisar que é chegada a hora de se aquietar. Uma cruzada para o sossego.

Assim sou eu quando em luz baixa. Minha mente fica pouco esclarecida e jaz quieta atirada em um canto qualquer. Esmaecem minhas idéias e até parece que se foram para sempre.

O fulgor da vida é assim. Às vezes se afina em tons etéreos, quase transparentes ficando nebuloso o juízo. De tanto ir e vir no meu louco pensar desprender-se do farol interior é necessário.

Do tom sombrio mas profícuo da solidão se refletem ponderações para a próxima ocasião.

Sossegue.

Uma rua

  Estanquei o passo ao me defrontar com aquela esquina, uma vez que ela tinha matizes diversos e contrastava com o que havia na minha memóri...