quarta-feira, 30 de abril de 2014

Pouco


Eu preciso de muito pouco para me sentir feliz e menos ainda para me sentir infeliz o que me fez então pensar em traçar algumas linhas e fazer comparativos, assim eu posso nortear os meus sentimentos de uma forma mais interessante e organizar a pouca alegria e o menor infortúnio. Não para os outros, seres etéreos, abençoados pela constante fuga de si, mas para mim. Um exercício delicado que, resoluta, vou empreitar. 

No muito pouco bom, basta-me ter de alcançar, fora da cama, aquele copo de água no meio da madrugada para me sentir abençoada e receber da noite gelada a mão que me reconduz ao sono e me faz merecedora dele. Da mesma forma o cheiro da casa de praia fechada me bafiando as narinas quando chego de surpresa transbordando de saudades de mim, me centra o espírito com um imediatismo mais poderoso do que qualquer boleta. 

Ainda posso acrescentar o vinho gelado bebido nas taças da família, a endorfina plugada nas veias por conta daquele programa de índio da turma do ciclismo, minhas meias de lã furadas e meu pijama rôto que sempre me acompanham no momento em que meu sofá me aguarda como se ele fosse uma extensão do meu esqueleto envelhecido. 

No muito pouco ruim tenho menos coisas a relatar, mas muito relevantes, como aquela furada nos olhos para não enxergar a traição, meu coração feito em picadinho de tanta espera pelo que não vêm, minhas mãos estendidas alegremente mas sendo cortadas sem piedade, a corrida para um abraço que não acontece e a percepção de que meus passos se dirigem a lugar nenhum. 

Para equilibrar esta conta que não fecha, de agora em diante só terei grandes sofrimentos, daqueles que paralisam momentaneamente, mas Deus dá a luz e a fé para seguir em frente.

 

sábado, 26 de abril de 2014

Rame-rame


O falatório não parava, parecendo flechadas de cupido recalcado porque quando tentava acertar um alvo apontava uma projeção que se desfazia no ar, ou, parecendo esta a hipótese mais correta, se desviava num tempo exclusivo e atingia um lugar diferente onde se encontravam duplas diversas e pessoas juntas em avessas. 

O som de todas as palavras reverberava pelo universo e como eram dissonantes na maior parte das vezes, por lá ficavam a vagar sem destino, se tornando inócuas e aumentando a tensão dos céus, irritando todos os arcanjos que queriam de fato fazer o arranjo e se ver livre da empreitada. Mas não seria desta vez e não tão fácil assim, porque o limite tolerável do rame-rame vai muito além de todas as forças contrárias e do intento. 

Incontroláveis palavras se sobrepunham umas às outras tornando as conversas às vezes, descontroladas e na busca do entendimento, derreadas.  Se unir era a intenção, o fracasso veio dar seu recado muito cedo e indignado com a falta de pudor dos gladiadores das letras ficou tentado a acabar com o discurso e a pose infame do pretenso acordo. Desta feita, ficaram sem chance de ouvir o que lhes vai ao fundo da alma e perderam a condição de serem agraciados com aquela ajuda do cupido destrambelhado, que perdeu a paciência. 

Enfim, a vida pede destino, o dia pede atitude, a tarde pede um encontro e a noite pede romance. O arcanjo ficou triste e resolveu descartar o rame-rame que para ele era promissor. Só para ele, é claro.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Facebook


Um lugar incrível, um verdadeiro paraíso onde está empilhado no espaço todo tipo de gente, uma realidade surpreendente mesmo para os dias que correm tão céleres, como um piscar de olhos.

 E por falar em vida física acho que o Facebook deveria ser um órgão do corpo. Penso que faz todo o sentido transformar o aplicativo em um órgão que fará parte da nossa anatomia e pode ser até com o mesmo nome, ou pré nome. Eu apenas sugiro que a localização dentro do corpo humano é que seria diferente para cada pessoa, uma vez que tudo acontece neste espaço, para o bem e para o mal.

Corações são partidos por conta do seu poder de estrago de espalhar desavenças, amizades de longa data são estremecidas por um esquecimento em curtir algum acontecimento importante para quem postou, e para quem viu, nem tanto. O dia começa na corrida cibernética pelos “likes”, levantando inimigos de morte na competição. Não sei se será uma parte do corpo que irá trazer benefícios uma vez que para se ficar conectado tem que se estar em frente a alguma tela que somente daqui a séculos saberemos se faz bem ou mal. Bom, vá lá, amores podem acontecer, mas correndo o risco da inveja e do mau agouro vir multiplicado em zilhões de falsos “likes”. 

Ele é um traíra, porque ao mesmo tempo em que reúne ele afasta quem se uniu, uma vez que a demanda é voraz na derrubada do que hoje acontece e urge no quê, ou quem, vem depois.

Então, acho que dever ter muita gente querendo que o seu Facebook esteja colado ao coração, porque é ali que ele volta ao passado e se encharca na lama da nostalgia, com aquela sede de ser de novo quem era, se sentir jovem, revigorado em rever tanta gente que se espalhou no mundo sem sequer se despedir dele. A gente poderia chamar de Çãoface. 

Outros talvez preferissem que ele se situasse junto ao fígado, porque desta forma haveria uma parceria etílica uma vez que o dito cujo filtra tudo o que o gajo entornar e o Facebook monitora os conteúdos. Assim, ficam juntos na saúde e na doença. Poderia se chamar Fígface. 

A galera indignada revoltosa com tudo, com todos e consigo mesmo, gostaria que o órgão estivesse colado ao intestino uma vez que este despacha o que apodrece em nós. Desta forma fica lógica a parceria escatológica. Um bom nome seria Inface. 

O principal parceiro do Facebook é o cérebro porque ele está no comando das informações, mas, não vou agregá-lo nesta minha visão apocalíptica porque não quero ver suplantadas as minhas esperanças que um dia este inferno acabe.

sábado, 19 de abril de 2014

Lexotan


Sempre muito bem vindas, a esperança e a alegria juntavam correntes para viver e pensar que o  que hoje acontece é o melhor, mesmo que as expectativas não se confirmem. Difícil discernir para que lado nos bandeie, uma vez que o que se apresenta perante nós pode vir com todo o sentido, ou, sem o menor sentido.

Então se abre em contornos tudo o que nos parece difícil de enfrentar e assim transparece nossa vida pregressa denunciando que talvez não sejamos capazes de seguir em plena vigência de nossas aspirações e, muitos dos nossos maiores medos, aqueles que nem a gente tem conhecimento, batam continência sem a gente menos esperar. 

As improbabilidades acontecem perante a tantas interlocuções sem o menor fundamento e vagam imponderadas em busca de respostas, ocupando o vácuo, sugerindo com sofreguidão que se esclareça, pelo menos, uma ponta do mistério. 

A ponta que se abre é tão nobre e por isso mesmo tão pequena, tão solene e ao mesmo tempo tão minguada que sequer aparece.  Porém, existe a outra face, aquela a quem ninguém se permite olhar e que sequer faz parte do todo, mas, enganam-se quem não lhe dá atenção, uma vez que virão deste momento, todas as respostas. 

Uma resposta, ou várias, sempre dependerão de um pensar acurado, do verter lágrimas de sangue, de estilhaçar as emoções em mil facetas para juntá-las depois com a paciência de quem sabe que com isto se reunirão seus pedaços. 

Pode até ser que na configuração final o resultado não apareça do melhor jeito, com aquela cara limpa de noite bem dormida e de um prazer incontido de saber de si, e assim, as respostas irão sufragar no buraco negro do inconsciente.

sábado, 5 de abril de 2014

Perdidos


Vez ou outra eu olhava em volta, um pouco para trás como se algo me incomodasse, ou pior, me obrigasse a prestar atenção, forçando uma barra. A pressão na nuca e certo desconforto no corpo acompanhavam a sensação. Como não é de minha feição ficar encostada no já transposto, ignorei.
Sigo em frente, porém, de novo, o chamado fez-me voltar o corpo inteiro com urgência causando um desequilíbrio e confusão mental. Parecia um recado. Aprumei o corpo todo, encorajando-me, e me enfrentei, antes que me enfrentassem.
Comecei imaginando qual a finalidade deste encosto morno neste exato momento, uma vez que a vida agora está numa quentura certa, apesar de dar muito trabalho controlar a temperatura para dar continuidade ao que se apresenta.  
Ando assim, tudo têm que estar no preparo certo, e, por isso, coloco todo dia na balança as medidas corretas para adensar esta massa disforme que é a vida.  Como ingrediente principal o longo suspiro antes de responder qualquer coisa já faz parte da receita, porém, erro a mão quase sempre e o acerto fica para a próxima.
O restante da matéria prima como a fala também continua intermitente porque ao invés de pensar antes de falar, falo antes de pensar. Com o sorriso não tenho deslizes, mas com o beijo sim, ele voa da minha boca e vai pousar no alvo certo, mas ele não está esperando e, às vezes, a hora é errada.

Os olhos estão sempre querendo passear acelerado pelos rostos tentando imaginar o que está por trás do semblante do outro e que segredos ele não quer compartilhar, porém, sempre encontro olhares carinhosos o que me dá um norte de que nem tudo vai mal e esta parte é boa.
Os braços andam desordenados e em descompasso, jogando-se à frente quase sempre num impulso infantil, se sobrepondo ao encontro e perdendo a oportunidade de receber um abraço caloroso que se perdeu pela minha afoiteza. Constrangida, balanço para um lado e outro e me recolho. As mãos acompanham todo o resto e também tem de ser lembradas a se manifestarem somente quando existe uma possibilidade de recepção real do afago.
Nesta análise e digressão de comportamento fiquei pensando que as sombras no entorno são os meus amores perdidos me chamando a atenção para os amores que advirão.

Uma rua

  Estanquei o passo ao me defrontar com aquela esquina, uma vez que ela tinha matizes diversos e contrastava com o que havia na minha memóri...