domingo, 26 de outubro de 2014

No chão


O dia ia alto quando A Menina foi expulsa do Prédio uma vez que iniciariam sua derrubada naquele mesmo dia, um pouco tonta e cansada de tantos avisos e desistências, sequer lembrou naquela hora que havia chegado o Dia. Era tarde, o Prédio já estava a postos para cair em pé. O Rio corria manso, na espreita de acolher qualquer cascalho que sobrasse e assim o desejava, para poder guardar no fundo do seu leito e continuar conversando com seu amigo, ou melhor, com o pedaço do seu amigo e, desta feita, resolveu ficar ali, quieto, olhando sem fazer rumor.

Agora o destino emocionante se cumpre após tantos e tantos anos e fica parecendo que a sustentação do Prédio foi feita apenas da memória de quem fez parte da história inesquecivel de uma indústria que por muitos anos foi referência na região, no Brasil e no Mundo. Assim foi a caminhada no mesmo lugar do Prédio, com muitos dizendo que era uma vergonha ali estar ainda de pé, conforme a Menina ouviu de uns e outros, até de quem foi seu amigo e também de outrem que sequer conhecia. Então, a luta nos últimos tempos não era somente no balança, mas não cai, mas na pauta da polêmica, o non sense do pseudo amigo e o despudor do desconhecido. A Menina depois do desabafo resolveu deixar para lá uma vez que estava dado o recado.

Foi com muita aflição que O Rio e A Menina acompanharam o quebra-quebra tendo ao lado O Prédio#Memória, que muito orgulhoso de si e de sua história olhava para a destruição do parque industrial. Muito inspirado falou por alguns minutos com seus amigos, alertando que neste país com dimensões continentais o patrimônio é derrubado em cada esquina como se a história não tivesse vez no mundo de hoje. Não só de hoje, mas de há muito e assim vai ao chão o que conta o passado para erguer nada em seu lugar ou na sequência.

A Menina, recomposta do bafão da derrubada observa com cuidado a demolição e agora se vê muito assustada porque ao invés de ouvir o som das pedras rolando escuta em alto e bom som os diálogos das funcionárias da salsicharia trocando receita, dos carregadores empurrando os grandes carros e descendo o elevador, falando de futebol e de mais uma vitória do Renner, do bater das maquinas de escrever no imenso escritório que reverberava a saúde da empresa. Do Sr. Gaspar chegando sempre muito cedo, sentiu em sua pele o gelo da sala de computadores que naquela época ocupava muitos metros quadrados e agora, sem nenhuma surpresa parecia ouvir o toc-toc dos tamancos holandeses do Julio Alfredo ressoando nos andares da fábrica e também viu a si própria secretariando as reuniões da CIPA.


E assim, um por um, foi acontecendo o esvaziamento do Prédio em queda livre e a onda branca da cabeça aos pés invadiu a Rua Ramiro Barcelos rumo ao coração de todos que fizeram parte da história e que tem amor ao trabalho.

sábado, 18 de outubro de 2014

No fundo


Como sempre acontece, o despreparo é bola cheia no encalço da testa desatenta e que está na vista certeira dos múltiplos talentos que por serem tão focados em seus objetivos praticamente não caminham com e entre os outros, mas sim, planam sobre tudo num jogo absurdo de encaminhar como sugerem seus desejos e tudo no entorno.

E é assim que se rouba a dignidade de poder pensar um tantinho, dar um breake na vida, cruzar os braços e decidir o não que grita com toda sua força, mas por incrível que pareça não consegue fazer-se ouvir. E assim a bola passa a rolar em campo minado e no arresto de todas as resistências que por ventura um dia por ali se cruzaram aparecendo do nada aquela teia urdida com um primor absurdo que enreda e prioriza o único caminho vislumbrado.

No tempo, então resoluto das decisões, cai por terra aquele andar firme, a maneira natural de negociar o que se apresenta, se esconde de maneira infame e vil a certeza do correto, se enche de duvida e névoa seca os pensamentos e assim se gruda a intenção forjada com precocidade, o pensamento arguto, a não discussão do teor desmedido que embala o normal, exacerba o desimportante e descontrola a razão.

E agora a trilha já foi formatada no gosto, a presa não vê outra saída além de seguir ao molde do sugerido mesmo com luzes piscantes no falso decoro e com aquela desconfiança leve que o caminho tomado não tinha volta e ao olhar para trás percebe que as migalhas de pão para retornar no caminho descrito não haviam sido lembradas. Era ir ou ir.

Sem poder escapar do algoz, é imperativo emplacar fervor na chegada, ousar ao máximo o resultado, defender o propósito com audácia, ser tão incomodamente assertivo que de tão firme o final terá mais peso que o inicio, quebrando as regras do outro e multiplicando o talento na resposta dada, concretizando um final de sucesso sequer imaginado. Na verdade, não foi necessário todo este empenho, uma vez que a presa possuía mais talentos inerentes a si do que o algoz.


O arrocho mal feito terminou após o desafio do pedido invertido de valores e verdade muito bem acompanhado pela argumentação capciosa e de promessas com inequívoco sabor de ilusão e de comprometimento às avessas que teve seu final coroado pela completa ignorância do resultado assim como uma lição do imponderável.

sábado, 11 de outubro de 2014

O de si


Tudo começa quando todos sentam, mas nem sempre o que vem dali pode ser útil ou aprazível porque a verborreia se abanca cedo, quando todos os elogios e a menção aos seus feitos são ditados um sobre o outro dando um chilique e apequenando quem não tem este costume e muito menos este talento, digamos assim.

A saraivada entre orelhas versa sempre sobre o umbigo do decujo que está se mostrando com um pula-pula sem conseguir, entretanto, sair do seu próprio circulo virtuoso com o objetivo de aparentar sua importância. O sou isso, sou aquilo é presenteado com uma cavaqueira onde a citação de pessoas importantes e lugares famosos atingem o seu momento mais incrédulo ao serem entremeadas em cínico tom casual onde todos estes adjetivos apregoados são considerados qualidades imprescindíveis para sua imagem pública. A fartura da chatice me faz entrar em total transe, paralisando meu raciocínio, me jogando no poço sem fundo do non sense.

Então tem aquele cara que não tem rumo de conversa que não seja o seu quintal enervando o público que deseja escapulir dali e bufa, pede licença, mas não consegue se subtrair do incômodo que soa pegajoso como doença ruim. Normalmente a voz acompanha o ânimo do estúpido arrebentando os tímpanos da companheirada. Urge uma providência, mas nem sempre é fácil se desapegar daquele idílio forjado, parecendo querer se infiltrar para dentro das cabeças mais pensantes que, infelizmente, neste momento ficam totalmente sem comando e à mercê da situação.

Existem aqueles que roubam do passado o que gostariam de ter sido e então carregam como um fardo precioso pela vida afora o ocorrido que não houve. Assim se faz o presente, costurado com linhas invisíveis ao olhar pregando cada peça remendada de outrora. Assim, nesta triste lembrança são retificadas uma a uma as situações que acabam se posicionando como um grande e aborrecido retalho de acontecimentos em que o novo não tem espaço, ou pior, quando chega se faz velho.


E a corriola vai desde a madama que perdeu a beleza há muito, mas sustenta a pose e a coroa de rainha até aquele senhor que anda com sua máscara ligada ao tubo de oxigênio de algum poderoso e é neste exato momento que abordo a vida, desesperada, e peço para dar uma encostadinha no meio fio porque quero descer.

Uma rua

  Estanquei o passo ao me defrontar com aquela esquina, uma vez que ela tinha matizes diversos e contrastava com o que havia na minha memóri...