domingo, 25 de julho de 2021

Chave do mundo

 

Aconteceu aquela procura de não sei bem o que ao despertar naquela manhã quente e ensolarada quando os pássaros ainda arrepiados do frio que ora vem ora vai, piam baixinho como se fosse acordar a primavera que ainda não apontou as orelhas e sequer é lembrada, afinal o clima tem que completar o seu ciclo. E, pensando nisso achei por bem dar uma vasculhada mais criteriosa nos achados uma vez que eu não conseguia saber direito o que procurava, ou ainda não havida subido à cabeça do que eu, na realidade, precisava, naquele momento esquisito onde a memória fica brincando de esconde-esconde com a paciência da gente. 

Melhor parar para pensar e escarafunchar por onde passeia a minha alma que, neste momento, parece ter se evadido do aqui e agora e se mandou a flanar em outras instâncias. Vou aproveitar a folga para encontrar o motivo que me está bafeando a nuca e não se mostra, deixando o ambiente meio sinistro uma vez que não encontro pouso em nenhuma das minhas ideias desde as mais banais até as mais complexas e confusas, coisa que adoro me debruçar. 

Por acaso pousei meu olhar num molho de chave muito antiga que não consigo me desapegar, seja porque tudo o que é antigo me força a voltar no tempo, um período que talvez não seja - nem nunca foi meu - e sobra sempre um sentimento frágil de que já andei por lá. Minha vista possui um ímã que sempre alcança o antigo. 

Moderei a visão isolando o molho de chave pendurado com simplicidade e determinada insolência me encarando como se de mim precisasse retirar uma opinião, um discurso, um propósito. Como eu já estava imbuída de encontrar quem me perseguia com tanta fúria nesta manhã de uma quentura fora de época decidi num ímpeto sacar aquela chave e buscar a porta original descobrindo de uma vez por todas o que me chamava com tanta veemência e, principalmente por qual motivo. Não precisei andar muito para descobrir que aquela tramela era a “Chave do Mundo” que eu criei na minha fantasia de evasão sempre que me aprouvesse e me levasse a outras galáxias para renovar meu espírito. Voilà!.

domingo, 18 de julho de 2021

Entre o céu e a terra

Fiquei parada ali sem saber direito como fui empacar neste entreposto da natureza, da vida ou o que mais imaginar que seja curiosa para saber por que raios me bandeei para um lugar tão distante do chão. Acomodei-me nas almofadas invisíveis do tempo fechado e me deixei levar pela mão para o que se apresentava a mim com tanta veemência me custando um dobrado para entender o que isto poderia significar. Demorou um tempinho, mas encontrei uma saída nobre para esta arapuca que o tempo resolveu me aplicar. Sempre ele a me perseguir e me desafiar. 

De cara, baixei a guarda e encarei o desafio como se fosse uma aventura do dia, um salto em obstáculos, uma investigação minuciosa do agora e uma parada estratégica para estancar o daqui para frente. Gostei da premissa e comecei a separar o que me vinha à mente neste descanso que me foi ofertado com tanta graça neste dia gelado, ventoso, e com mar do avesso. Pelo jeito a ode não deverá se dirigir ao tempo, nem ao mar, nem ao vento e muito menos a chuva escassa. 

Este momento único me parece lançado no espaço justamente para que possa ter em perspectiva uma determinada revisão do que anda variando quando se anda com os pés no chão e que muitas vezes com asas nos calcanhares se envergam sem destino na temporada que - dizem alguns - é mais preciosa frente à vida. 

Livrei-me das asas há um bom tempinho e agora ando por ai com muita calma buscando captar o que sempre passou despercebido uma vez que a celeridade de tudo exigia ser exímio em salto em vara e maratona de todo o calibre e deste jeito carinhoso que apareceu do nada aproveitei para me dedicar ao descanso da alma neste colchão de nuvens que além de me acolherem, me aquentaram, silenciaram os rumores entre si, e, importante, não me perguntaram nada e foi assim - bem quietinha - que ouvi todas as respostas.

sábado, 17 de julho de 2021

O ciclista

  

Basta a decisão de jogar-se no selim e dar tratos às pernas que deve se mexer em cadência que melhor aprouver e seguir em frente de orelhas em pé, sorriso no rosto e semblante combativo porque o que vem pela frente pode ser vento cruzado, sol queimando a mufa, chuvisqueiro fora de hora e os percalços do caminho que mais parecem solavancos inevitáveis que a vida apresenta, porém, tudo isso desaparece como em um passe de mágica pelo único motivo que o corpo adere à si a natureza e como máquina perfeita já começa a trabalhar para deslocar a loucura que por qualquer motivo já se instalou em seu sistema como se fosse erva daninha e assim de pedal em pedal avança para o caminho que se abre à aventura. 

O passeio se inicia com o reconhecimento do terreno em frente que briga o tempo todo com os olhos que querem navegar em ritmo menor na observação e encantamento da paisagem que quase nunca é percebida quando percorrida célere e cegamente para lugar nenhum, para resolver o que resolvido está, para achar o que nunca apareceu, para lembrar o deletado, para encontrar a conversa sem noção e finalmente voltar ao ponto de partida arriado de intenções, moído e tonto por não haver enxergado quase nada do caminho. 

O caminho das duas rodas não tem muita importância porque muitas vezes se segue o nascer ou o por do sol, o quadrante ventoso que melhor convier, a temperatura ideal escolhida a dedo no patamar do dia que nasce ou termina, o  corpo se mexendo de maneira automática e esforçada para vencer a si mesmo, muitas vezes, com respiração e bate-bum do coração em cadência perfeita com o ritmo do mar. 

A cabeça ao vento dá sinais de alienação momentânea do entorno que passa em câmera lenta atentos ao caminho desviando com alegria dos percalços, fazendo força para subir e rindo muito na descida. Assim encontra-se um estado de alma mais infantil, brejeiro e sorridente para começar ou terminar o dia.

Uma rua

  Estanquei o passo ao me defrontar com aquela esquina, uma vez que ela tinha matizes diversos e contrastava com o que havia na minha memóri...