sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

A máscara


E assim foi naquele dia de vasculhar guardado, revolver gavetas, abaixar caixas e caixas de tralhas de tudo o que é tipo, fazer voar as traças, assoprar o pó do tempo em tudo o que jaz esquecido e escondido, mas nada de encontrar aquele artefato.  A caraça no dia a dia de muitos ordena a camuflagem de usuários pertinazes que não se agitam para vesti-la em dia especifico, mas a incorporam para todo o sempre. Mas aqui a conversa é outra.

Fãs de muitas tribos nesta data específica se travestem utilizando uma máscara que simboliza uma folia sem precedentes conferindo de praxe ao seu portador um ou mais personagens afastando-o do seu próprio como se de fato fosse imprescindível vivenciar outras individualidades, como se não houvesse alternativa para mudar a sua e que este evento fosse a única maneira de sonhar com outra biografia, se retirando, por alguns dias, de sua vida falsa.

De certo modo não demorou muito para surgir em um cantinho, bem abafado, cheirando a naftalina, aquele disfarce que em outras épocas serviu como simulacro para sair às ruas. E assim ela surge colorida, com vidrilhos cintilantes e sinuoso feitio, com um perfeito bordado que contorna os olhos deixando-os com outro matiz, e não somente isso. Uma alma nova brota da fantasia que encabeça por dias adiante uma folia desvairada, um langor atávico, uma pressa de ser feliz apesar de se ter ciência de toda a ilusão circundante.

De certa forma a ocasião favorece a muitos a oportunidade de retirar de seus próprios olhos aquela dissimulação carregada com tanto empenho ao longo do ano, esta mesma que vai lhe corroendo as entranhas, lhe azedando o estômago e o fazendo pensar e falar com o fígado.

Assim a festa pode vir a conferir àquele rosto cínico uma aparência contrária a que esta face carregou e como se fosse uma mágica do convescote um rosto transfere a si outra aparência, como se esta alegoria insuflasse àquele rosto tantas desobrigações, causando de fato um apelo à transformação.

E com uma maneira bem simplória lá se foi o personagem envergando nova aparência que lhe audita outra identidade que de certo modo trai  a quem ele era, porque assim escondido, não deixa à mostra sua feiura, acrescenta muito brilho ao seu olhar opaco, lhe destranca a fala, lhe ferve as cordas vocais em cantorias, a sede etílica é avassaladora e assim, por tanto tempo que lhe é expressa a alforria, aproveita em ser o outro ou talvez o seu eu de fato.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Prece de morador


Fazia um tempo que eu não tinha mais acesso à paisagem na minha sacada porque as empanei com um lindo tecido de seda, um pouco transparente, com algumas faces se voltando ao bege e outras mais nevadas. Eu as coloquei ali com certa dor no coração porque nos entardeceres desta morada praiana a luz que inunda a casa nunca tem a mesma cor sendo sempre surpreendente. É sempre nessa hora que meu coração se aperta, meus olhos lacrimejam de saudades de tudo, absolutamente de tudo.

E junto a estes sentimentos tenho minha boca ensaiando sorrisos a Deus, porque não quero ser mal-agradecida por todo este panorama em minha frente, que na verdade, não tem nada de mais, mas é único, porque a natureza o privilegia e lhe confere de quebra um som, o barulho do mar, que hora ruge ora se amaina, mas nunca se cala. A morada me brinda com um estado de espirito em que os pensamentos podem se desordenar vez ou outra, porém nunca se perdem sem que se dê a eles um destino certo, ou que se coloque o dito cujo em algum lugar da cachola para que mais tarde se analise e se tome decisões.

Fui obrigada a tapar o cenário com esta peneira translúcida porque em tempos de calor tudo o mais que se estabelece no entorno fere meus olhos, aguça minha tristeza, alimenta meu desejo de solidão me deixando um pouco inaudível a outras demandas importantes.

Com a invasão do entorno que segrega o que estabelecido está, que bagunça a ordem natural do vilarejo, que alardeia o que ninguém quer comprar, que aflige a passarada com ruídos sem cabimento, que arrasta sua alegria rua afora, que se arremete como se ouvidos não tivesse, que se comporta como se não houvesse códigos que em um entendimento comum são óbvios.

Foi com esta finalidade que as pendurei na minha varanda porque pelo menos na visão embaçada que o voal me proporciona, tenho a impressão ingênua de que o exterior continua simplório. Arrisquei um olho enviesado para meu calendário e agora já vislumbro muito próximo o dia em que o espetáculo a mim devoto, voltará ao meu poder.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Santuário


É certo que ele vai chegar porque o calendário nunca falha, e seu cheiro está sendo percebido com antecedência e se faz muito suave, o vento que o acompanha é fluído parecendo que descansa em todos os galhos de árvores por onde passa balança com suavidade os arbustos, as flores, espana a areia das calçadas com sabedoria, facilitando o trabalho das zeladorias, refresca as crinas dos cavalos que ainda andam por aqui e ali, acariciam os cachorros abandonados com muito jeito porque, estes, aumentam de população assim que a massa ignara se vai aos atropelos e o carinho lhes falta.

Outro sinal evidente é o sol que agora se afasta lentamente para um lado onde ao surgir terá cores mais suaves, vai brilhar por entre alguns telhados e galhos de árvores, vai espiar por sobre outros tantos tetos, altos e baixos, vai se esconder um pouco mais entre nuvens. O que vem por aí deve abrandar os calores da terra, as sementes ficarão mais escondidas e os bichos de estatura mínima poderão correr mais soltos, sem o fogaréu a lhe queimar as ventas. De certo que os tons terão matizes de primeira linha, todos beirando tons de sépia, amarelo cadente, verde diáfano e vermelho rubor.

Depois de a natureza perceber a sua presença, porque os ares o prenunciam, a euforia viceja para quem fica e que de certo modo nem muito alarde faz, talvez para não difundir a pratica de fazer parte de tudo na vida, mas com o tempo fazendo conta certa e não conta de cabeça. E é deste jeito um pouco “amoitado” que todos os dias o sorriso ilumina toda a feição, os olhos se abrem com muita facilidade porque as horas estão novamente sendo marcadas com exatidão, os trinados voltaram a ter seu poleiro e a noitinha se instala mansa, respeitosa e reverente com seus convidados de cotidiano.

A celebração é verdadeira quando se pode sentir que some como por encanto os olheiros de plantão, os conversadores de todos os naipes, os obrigatórios convescotes e as palavras vãs. Um santuário é um lugar onde de pouco se precisa.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

De caso pensado


A desconfiança não aparece em nenhum momento sequer quando as falas, lá pelas tantas, poderiam esconder uma segunda intenção, uma razão mais vil e que naquele momento não deveria vir à baila, em hipótese alguma. E deste jeito a ilusão toma conta de todas as letras, parecendo de certa feita que a pontuação não esta exagerada, que as vírgulas separam o joio do trigo, que o verbo se encontra em perfeita conjugação não havendo qualquer distúrbio. Não demorou muito para que todos estes pontos se alternassem em sua conclusão porque uma parte bem importante não teve a atenção devida e, deste jeito, não há grafia que desminta o que as escritas valeram, porém, em algum momento faltaram algumas advertências.

E da pior forma vem à tona que não basta que todas as regras estejam acordadas por uns e outros porque quando existe uma brecha, é justamente ali que irá vazar o que lá atrás não se deu muita atenção. Mas, surpreendentemente não se imagina que todas as boas intenções seriam tão enganosas, que a pressa seria a causa de menos análise, ou que a ingenuidade seria um algoz de tão alta relevância, se somando a tudo que a confiança nata na vida proporciona a quem tem na ponta de sua lança perfumes ao invés de venenos.

Na verdade nunca termina a intenção subentendida de um caso pensado que tem por sua vez a finalidade de deixar em entrelinhas bem abafadas o real motivo, que joga todas as suas fichas em sua vitória, em seu poder de persuasão, em sua forma de ter para si, mesmo com intenções veladas, o que lhe aprouver. Assim, nas sombras, o que o difere de outros tratos é sempre a pressa, a urgência, a data apertada que ocultamente faz estremecer o outro lado e acelera o passo sem nem direito saber por quê.

É neste exato momento que a corrida acelera mesmo não sendo sua, a vida corre em desabalada carreira mesmo que a problematica em questão seja a do outro, e, finalmente, o sangramento do caso pensado advém da hipótese plantada de que tudo dependeria de você.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Verdades e mentiras


Em um abrir e fechar de olhos todas as falas se fizeram ouvir, e de tanto alarido a escuta restou impossível, mas para ouvidos mais afinados com o que se conta, o que acontece e no que se acredita, a proposta de entendimento se embaralhou de tal forma que não persiste nenhum olho, língua e pensamento que se coordene por entre tantos.  A fauna das ideias se instala semelhante a uma floresta que diversa e abundante acolhe todos os seres, mesmo os de menor douro e oriundos da selva que ora se emaranha com certezas, ora se desmantela em dúvidas.

E é com um anúncio de assuntos que a verborreia corre solta, batendo de boca em boca, azedando a saliva, testando a paciência de uns e outros, cansando de modo interminável quem se achegou por ali por desaviso ou com boa intenção, e, neste rosário de contas enlaçadas, porém sem vínculo, as verdades vão se conjugando. Mas, o verbo idílico conjuga verdades e mentiras com certa incapacidade de conter tudo o que aflora e assim vai se formando uma reza pagã,  rica em metáforas, aforismos e absurdos que vão alimentando a falácia.

Um tom com certo jeito surdo vai abrangendo a conversa de um modo bem peculiar como se fosse jogado magicamente um pó de bruma seca empanando o que deveria ser às claras. Mas ali, já se viu que tudo e, o que parece, não é.

Sempre acontece quando menos se espera, quando a lorota é lançada e mil vozes a abraçam com ferrenha fé, o conluio confere o selo da verdade absoluta e assim, nestes descaminhos vão se desdobrando os rosários que agora um pouco desacorçoados vão separando conta por conta, espalhando agora uma multiplicidade de finais de conversa.

E com certa timidez vai-se catando aquelas pérolas que rolaram do cordão como sem proveito, assim como se na confusão ninguém lhe houvesse prestado atenção, como se verdade não fosse, como se o provado não houvesse, o verdadeiro não existisse, e as boas intenções soçobrassem em um instante apenas. Tantos faunos na selva empedernida.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

A garrafa


Tropecei no artefato e quase me fui ao chão rolando sobre ele, mas o que mais me chamou a atenção é que havia dentro da garrafa um bilhete e que, em um primeiro momento, parecia desenhado o meu nome em tão mal traçadas linhas. Depressa resolvi investigar porque nestas paragens de exílio auto- concedido e abençoado, as surpresas vão acumulando como se fossem bônus para quem agora olha a vida como um tempo que não precisa ser contado, apenas sentido e, de certo modo, tenho autorização para retratá-lo às minhas expensas.

Mesmo muito curiosa eu não tive coragem de abrir a garrafa porque de fato o seu conteúdo poderia virar pó ao se contaminar com estas aragens de beira de praia, tão diferentes de um além-mar cuja origem me parece ser a do objeto. O oceano em suas profundezas seduz a todos que desejam dispor de suas águas revoltas como se fosse um guardador de segredos ou um túmulo que se fecha ao lhe ser confiado uma missiva.

Fiquei ali, com um sentido de que talvez eu tenha sido descoberta, mesmo que eu não tenha fugido, vai que uns e outros se permitam pensar que foi o que eu fiz e assim, ao não me encontrar no meio do mundo do caos, acharam por bem me procurar por aí. Penso também que talvez o mar tenha sido a primeira opção por me saberem com um sentido atávico em relação ao litoral desde que recém-nascida e que passei a respirar a maresia como se ela assim fosse o meu oxigênio de sobrevivência.

Voltei a me concentrar no bilhete que a garrafa sem rotulo portava e que mostrava algumas frases antes de se arredondar em um minúsculo canudo para que assim ali coubesse. Sentei-me, agora mais tranquila, com a missão concedida pelo mar de recolher aquela carta que veio até mim como um símbolo de recados idílicos, de amores remotos, de busca de vidas arrastadas por ela mesma.

Acometeu-me de pronto certo cerimonial na busca do conteúdo que poderia ser alcançado se exterminasse em mil pedacinhos a existência vitrificada que ora se apresentava. Aprofundei meu olhar pela enésima vez àquele bilhete aprisionado e que mais parecia ser um recado do passado e, assim, ao dar-me conta desta possibilidade lembrei-me que quando fiz o salto, toda minha bagagem estava comigo, tanto as de preferência quanto as de nem tanto.

Deste modo, devolvi ao mar o que não me pertencia e deste jeito, assim meio afoito e ao mesmo tempo crente, tenho a convicção que talvez eu tenha sido contaminada, em alguns segundos, pela ilusão da vida.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Dois cliques


São necessários dois cliques apenas para despertar o assunto que toda a noite persevera em desistir e ir para os cafundós dos judas, mas, não tem jeito, aqueles dois dispositivos são a alma de todas as manhãs, então o que se tem de fazer é seguir os passos que eles apontam. Não são poucas as dicas que se jogam para fora do dito cujo, escorregando suavemente por tudo o que lhe sustenta, lambendo de certa forma insolente o vão exíguo que separa o  pulsante da realidade humana que vespertinamente se impõe com autoridade, mesmo que nestes cliques, ela escorregue por sobre a mesa, transpasse os dedos frágeis, ignorem o despertar manso, como se não almejasse nada, como se pudesse ser sorrateira ou como se de certo ninguém lhe desse por falta.

O primeiro, o mais contemporâneo, recebe o afundamento de uma mão trêmula, resistente, que com muito medo e frio se vê obrigada a fazer o movimento que, de tão peculiar e recorrente se sente incapaz de não o executar. E vai dai que os mil pensamentos vão se atropelando e fazendo de certa forma uma analise da validade de novamente enfrentar tudo o que esta atitude vai trazer à tona em primeira mão - com muito orgulho dizem eles - todas as barbáries, os malfeitos, os escândalos, as badnews, deixando assim, bem de cantinho, tudo o que pode trazer certa luz, uma inspiração, uma dica, um alento, uma certeza de qualquer coisa ou de tudo. A fraqueza na busca do melhor neste tempo de perfídia atropela estes primeiros instantes frios, prevalecentes e sequiosos de clareza.

O segundo clique remete sempre ao antigo e a promessa que a partir deste momento quase mágico, em que o corpo físico recebe o elixir que o fará voltar ao raciocínio e se acercará de todos os movimentos cerebrais fazendo assim as pazes com a noite de terror anterior. Isto feito com certa mágoa, uma vez que se vai dormir com os anjos havendo ali uma tremenda injustiça porque se sonha com os demônios e se acorda com os perseguidores. Porém, a mágica do renascer a cada dia demonstra com unanimidade que cada vez é uma, que cada noite é única, que cada tormento é o último, que cada perseguição não se repete, que um idílio enfraquece, que a conexão cai, que o previsto se esvanece como pó de mico e que depois destes dois cliques tudo recomeça. 

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

O banco


O desafio desta época é ver aquele banco de praça lotado destoando do ambiente normal do resto do ano, onde o que mais tem vida são as ondas do mar, a cachorrada de rua engalfinhada, a areia correndo solta com ventos do norte e as garças perdidas para o lado de cá provavelmente aliviadas da superpopulação que impera em tempos de calor.

Eu o tenho sempre na mira e ouço todas as suas histórias com olho no olho quando ele está vazio, uma vez que nossa fala é a única por estes lados. Ele não pranteia a falta de companhia, não se irrita com os passarinhos pousando em si nem nos galhos de árvores que lhe vem por cima. Não se sente inútil por ficar tanto tempo sem que ninguém se assente para o descanso, não se verga quando o vento bate forte e não se importa quando a chuva vem lhe açoitar. Passa seu tempo sempre como novo. Inabalável.

Temos muito em comum eu e ele, a começar o gosto pelo silencio, pelo desejo de solidão imponderável, pelo acolhimento de todas as falas mesmo as mais rudes, não conseguindo de nenhum modo revidar, e, também, pela situação contumaz de se fincar no mesmo lugar. Não gostamos de partir, porém há sempre àquela hora em que ele, quer apodrecer e desistir, ali, a mercê de tudo e de todos e eu, agonizo a todo o momento porque o trem da minha partida não me fornece a data, nem horário e local.

Porém, nem tudo é defeito. Ambos gostamos de ouvir conversas, as mais interessantes, as mais vulgares, as mais inteligentes e as mais burras. Mesmo não metendo o bedelho no assunto ouvido temos a certeza que esta pauta nos alimentará por alguns dias.

E é chegada a hora dele, do banco, ela sempre vem, quando a variedade de criaturas vem se assentar em seu dorso e destrambelhar seus assuntos. A fauna humana se estabelece quando o clima começa a esquentar e a sucessão de causos compartilhados em cima dele o deixa em lastimável estado de confusão.

É através dele que a conversa variada toma corpo, se assoma ao tempo recortes das vidas de uns e outros, a erva amarga rola entremeada por pingos etílicos, alfinetadas sem intenção e figurinhas são trocadas sem a menor serventia porque são tempos etéreos.

Então fico olhando de longe meu amigo banco sempre tão bem intencionado e assim como ele muitos de nós, só que na maior parte do tempo só nos resta ser o observatório da vida em movimento.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Contagem regressiva


Senti que havia um bom dia diferente da passarada nesta manhã, que também acordou mais tarde, trinou como se cochichasse e a dupla postada no fio de luz, espiou para minha janela e, eu juro, sorriram de leve, abrindo um pouco o bico com um tom cínico reverberando novamente aquele sussurro que me pareceu que continha um recado.

Como sou crédula com a minha vizinhança natureza passei a observar outros sinais que pudesse me revelar algo mais deste dia que já começou diferente. Vai daí que ao ver o calendário me dei conta que a minha marcação particular sinalizava com muitas estrelas a data e, buscando explicações em mim mesmo – uma vez que nada escrito havia - encontrei um sinal brilhando e se não me engano, meus delírios de solidão marcavam felicidade. Mais curiosa e animada resolvi ir a fundo ao assunto das garantias.

Pude checar que os pescadores que, diariamente, na manhã bem cedo, se arremetem pela minha rua, andam fazendo sua caminhada quando a noite ainda não se foi. O sol madrugador me dá o sinal que anda atrasado e isto significa que já está se bandeando para outro lado dos quadrantes, com certa lentidão eu sei, mas não demora não o avistarei assim de frente. Em seguida nos veremos de esguelha, prenunciando um namorico de outras estações, o que arremete a bons sinais.

E foi deste jeito, como se houvesse aberto uma caixa de pandora que todos os elementos estranhos ao lugar vieram me dizer que em breve abandonarão o local.

E então consegui conjecturar que realmente a contagem regressiva estava em andamento. Na minha rua não mais haverá carros estacionados, o cenário da minha janela não irá incluir os sanitários químicos da orla, os carros na beira da praia sumirão como por milagre, a multidão literalmente acampada na areia se evapora, desaparece o desfile de cães e gatos pela calçada emulando seus dejetos preciosos e catados com ardor pelos seus donos, acaba a balburdia das famílias, fecham-se os portões, as janelas, as cancelas, as cortinas desaparecem, as escadarias emudecem e os vizinhos se calam. Assim, a minha vida e a de muito poucos consegue respirar fundo e voltar.

Uma rua

  Estanquei o passo ao me defrontar com aquela esquina, uma vez que ela tinha matizes diversos e contrastava com o que havia na minha memóri...