segunda-feira, 30 de junho de 2025

Arroubo senil

 


Eu tinha certeza do que ia acontecer mesmo sendo avisada do perigo iminente que a cada dia mais se aproximava de mim, deixando farpas pelos cantos, sinais silenciosos quase inaudíveis que serpenteavam no entorno como fumaça magica penetrando lentamente na casa, chegando com força naquela prateleira de livros rota de tanta leitura que segue a postos para qualquer consulta. O dicionário Analógico amarelado do tempo de uso, segue firme, resguardando com carinho todas as palavras que capitaneiam o meu raciocínio e me fazem voar no tempo, no dia, na noite, na luz e na escuridão.

Em outro canto percebi que a pilha de papel em branco se acumulava, as canetas de anotação estavam sem tinta assim como os lápis careciam de ponta fina para arranhar com pressa as resmas de papel que perambulam por toda a casa. Todos estavam relegados a um recanto não havendo ao meu alcance nenhum instrumento dando a impressão de uma varrição de ideias da minha velha mesa de trabalho.

Me voltei mais animada para a minha escrivaninha, esta que recebe com toda a paciência do mundo, meu grito de revolta, meu suspiro de saudade, meu olhar molhado de lágrimas, minha gargalhada e meu choro convulsivo e percebi que havia sido surripiada minha inspiração, eivada de provérbios, advérbios, pronomes e pontuação - sem falar nas palavras inventadas - que me acompanham por cima do ombro como fieis algozes do assunto. Aceitei este mando Divino e considerei o fato como um arroubo senil causado pelo delicioso ar gelado da costa. Voilá!  

Nenhum comentário:

Dia do amigo

  Encontros acontecem a todo instante cruzando nosso caminho, pulverizando a atmosfera que nos envolve com um delicado lampejo divino e entr...