A vida gosta de ficar suspensa no varal, muitas vezes do avesso, de cabeça para baixo, de lado, pelas pontas, pelo meio e assim as vestes do mundo se expõe dependuradas, todo dia, nas cordas de todos os lugares para tomar um ar, pedir ao sol que jogue seus reflexos que dançam conforme o vento criando um movimento dinâmico e colorido em que os trapos ganham independência e, de certo modo, estão livres de corpos suarentos, gordurosos, esqueléticos, mal cheirosos, perfumados perfeitos e imperfeitos.
Tremulam ao vento camisas que, dependuradas, não tem razão de existir porque lhe falta o sujeito que a enverga e, por este mesmo motivo, a vestimenta liberta do seu dono balança ao sabor da estação, muitas vezes, demorando a secar, talvez para não voltar ao corpo que cobre e circular por entre muitos e pelos quais não nutre simpatia. Melhor andar dependurado ao frio e ao calor causticante do que seguir caminhos transversos parecendo ter um desejo secreto de se tornar roto mais rapidamente e sair daquela prisão corpórea e de destino indesejado.
No mais, enfileirados com criteriosa organização, em muitos casos, seguem juntos molhados e com variante de cor e textura calças, casacos, fraldas, lençóis, toalhas e mais o que se tem em uso na residência podendo haver sujeira de uma vida no campo contendo terra, folhas, espinhos e flores secas que se grudam ao tecido para se aventurar por ai, fora do solo, conferindo o que rola por outras terras.
Pode haver também a sujeira da cidade e do asfalto, a
fuligem das chaminés, a poeira das calçadas, o respingo das sarjetas na
vestimenta dos executivos impecáveis e urbanos que transitam pelo caos das
cidades, deixando suas roupas com mais manchas que alguém possa ter a
capacidade de tirar. Deste modo interessante as cidades deixam as marcas nas
roupas que nenhum varal poderá limpar.
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