quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Mantra


É só me chamar que eu vou, parece que é um mantra, com um jeito tão intenso que parece acoplado na ossada, inserido na derme, imerso na goela, como se conjugasse todos os verbos desde sempre. Não era uma ilusão, era uma verdade até que chegou o momento em que estranhamente o decujo não soava mais os ouvidos com tanta intimidade.  Naquele dia alguma coisa estava diferente, e, de certa forma, não se escutava ao fundo aquele diz que me diz de todo instante, quebrando deste jeito impulsivo o som da ordem.

E assim nasceu o dia em que o mantra enraizado se iluminou sozinho e foi buscar em outras paragens o sujeito de sua vida, a sua concha ensimesmada, o seu pó de flor que espirra macio em todas as direções.  Assim chega um novo alvorecer onde todos os chamados são diferentes dando opções de vida, de poder pegar e largar, de não escolher, de deixar tudo, mas tudo para depois, de ouvir o som e a voz do vazio.

Na ausência do bate estaca monocórdio aconteceu o improvável, uma vez que em sendo liberto das amarras, os pulsos da mente ainda se contorcem na procura de desamarrar os nós, o ouvido se espicha notadamente como se faltasse algum acorde para o concerto daquela hora e os pés se posicionam na marcha que some na medida em que avança.

O caminho é diferente, não por ser novo, mas por ter sido escolhido justamente por não ter serventia aparente, por haver em seu trilho as mesmas coisas de sempre, porém, vistas da esquina em frente, com uma iluminação densa, com as nuances imperceptíveis aos olhares ligeiros e a interessante alternativa de poder escolher.


Agora sem rumo, caçando o improviso, o cenário se agiganta com força e se espalha dando asas a todas as preces sussurradas com fervor durante os dias e noites que se avizinham tão celebradas. O som é variado porque vem sem sugestão, o passe é livre, os nós jazem esquecidas pela inatividade, o alcance, outrora soberbo emudece para sempre e assim os passos acompanham a voz desafinada que ensaia outras Arias.

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