Eu preciso de muito pouco
para me sentir feliz e menos ainda para me sentir infeliz o que me fez então
pensar em traçar algumas linhas e fazer comparativos, assim eu posso nortear os
meus sentimentos de uma forma mais interessante e organizar a pouca alegria e o
menor infortúnio. Não para os outros, seres etéreos, abençoados pela constante
fuga de si, mas para mim. Um exercício delicado que, resoluta, vou empreitar.
No muito pouco bom, basta-me
ter de alcançar, fora da cama, aquele copo de água no meio da madrugada para me
sentir abençoada e receber da noite gelada a mão que me reconduz ao sono e me
faz merecedora dele. Da mesma forma o cheiro da casa de praia fechada me bafiando
as narinas quando chego de surpresa transbordando de saudades de mim, me centra
o espírito com um imediatismo mais poderoso do que qualquer boleta.
Ainda posso acrescentar o
vinho gelado bebido nas taças da família, a endorfina plugada nas veias por conta
daquele programa de índio da turma do ciclismo, minhas meias de lã furadas e meu
pijama rôto que sempre me acompanham no momento em que meu sofá me aguarda como
se ele fosse uma extensão do meu esqueleto envelhecido.
No muito pouco ruim tenho
menos coisas a relatar, mas muito relevantes, como aquela furada nos olhos para
não enxergar a traição, meu coração feito em picadinho de tanta espera pelo que
não vêm, minhas mãos estendidas alegremente mas sendo cortadas sem piedade, a
corrida para um abraço que não acontece e a percepção de que meus passos se
dirigem a lugar nenhum.
Para equilibrar esta conta
que não fecha, de agora em diante só terei grandes sofrimentos, daqueles que
paralisam momentaneamente, mas Deus dá a luz e a fé para seguir em frente.