segunda-feira, 3 de março de 2014

ABISMO


Nunca pensei que haveria de cair no mesmo erro, de falsear o pé e me ver na beira do abismo, com todos os gigantes olhos me olhando de baixo para cima, rindo da minha cara e de dedo em riste parecendo dizer, eu te avisei.
Claro, que se eu tive algum vislumbre de lucidez, ele se fora na instantaneidade que a novidade te dá e a esperança fornece, pois a cada dia em que o sol nasce tudo se transforma e lá vamos nós como guerreiros ensangüentados e maltrapilhos em busca da ilusão, do oásis, que com certeza fica logo ali, pensamos repetidamente. Logo ali.

Mil coisas me passaram na cabeça e a primeira delas é que os tempos de calma haviam chegado e assim cavalgava acelerada na minha maturidade e me orgulhava da minha clareza e todo dia a folha branca que me aparecia era preenchida. Então, estou andando bem a par e passo.
O desaviso me rasgou por inteira, lavrando o que eu tinha de melhor, deitando por terra a confiança que eu acreditava viver e neste momento, tenho as pontas dos pés beirando o vazio do mundo.

Um vazio, infelizmente, preenchido pela prepotência mascarada de elegância onde nas entrelinhas surgem a falsa modéstia, a inveja e o falso poder. Um espaço oco recheado de artimanhas torpes e deboches muito bem articulados.
Meus pés deslizavam com suavidade para baixo e para cima, deitando seixos na fundura do precipício e com meu corpo oscilando ao vento naquela beirada, ouvi alguém me chamar, surpresa, me equilibrando, dei meia volta. Este alguém era eu.

4 comentários:

Jornal de Ideias disse...

Perfeito, querida! Só quem pode nos tirar da beira do abismo somos nós mesmos. Ele é a margem do que somos!

Antonio Barcellos disse...

Concordo com Andréia.

Antonio Barcellos disse...

Concordo com Andréia.

Anônimo disse...

Vera, um dos textos mais bonitos, embora possa ter esquecido o que senti com alguns antigos. Uma introspecção que não busca fora a energia de que precisamos. Beijos. Maria Rosa

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