domingo, 20 de fevereiro de 2011

Portabilidade


Tenho mais paixão pelas palavras do que pela escrita, com acessos contínuos de trazê-las à berlinda, usando-as para me deliciar com seus significados, retorcendo um pouco e surpreendendo do tanto que podem mudar nosso pensamento e atitudes. Portas e janelas se abrem ao novo, inusitado, diferente.


A portabilidade é uma dessas novas palavras da moda. De repente temos o direito adquirido de levar a outro protetor tudo o que recebemos por anos a fio de facilidades e de apego mútuo por aquela senha gravada na nossa mente e de todos os que queremos bem. O passaporte do contato.

Por ele nos conectamos com o mundo, negociamos desarrufos, matamos com força de sabre a saudade e chegamos, em segundos, aonde queremos estar. Do outro lado do nosso fiel servidor sempre tem alguém ou “aquele” alguém que de pronto atende o chamado. Uma ligação desesperada, outra morrendo de amor, ou, muito engraçada. Vazar as palavras desta forma se torna imprescindível para se estar junto, apesar de que as falas ao vivo, com todos os seus tons, sobre-tons e surpresas estejam tão fora de moda.

Depois de tanta conversação e fidelidade inescapável nos códigos adquiridos surge outro protetor que nos oferece a mesma coisa conservando o mesmo número. O poder da sedução moderna joga pesado, e, um pouco sem pensar, nos atiramos nos braços do distinto que nos promete tudo e muito mais. Relegamos sem medo nosso futuro das comunicações a este mundo hightech que se apresenta cheio de promessas de mais simplicidade, mais interatividade, mais e mais. Tantas juras.

Vou fazer a portabilidade do amor no meu coração.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Castelo de Cartas


Uma a uma as cartas foram sendo jogadas, indecisas algumas, apostadas com vigor outras e tímidas também. Porém, em sua maioria, a sorte pendia para os apostadores agressivos que jogavam suas fichas com sofreguidão e a desordem de quem não respeita as regras, quaisquer que sejam elas.

Foram sendo colocados muitos reis e um nadinha de súditos, parecendo a todos que o coringa estava submerso neste baralho estranho, onde apenas as cartas autoritárias tinham vez.

A jogatina era pesada, com apostas determinantes a qualquer preço, sem pensar, sem olhar o semblante do outro jogador, sem a astúcia das cartas na mesa assim como as do centro e nas mãos dos parceiros.

Me chamou a atenção as rainhas de muito baixo escalão que seguiam orgulhosas sem ao lado olhar, construindo seus castelos a partir da destruição de palácios, atravancando a operação pelo bel prazer do orgulho e da prepotência. Altivas, o valor das cartas careciam de inteligência e a soberba imperava e seguia incólume, encostando sempre no líder da mesa – o Ás de Ouros – que apesar da fama de herói era o mais pobre coitado do carteado.

Todos os reis agrupados mais se degladiavam e se concediam glórias entre si, do que propriamente jogavam suas cartas com habilidade e presteza. Assim era impossível entrever a situação no tabuleiro que também abrigava excelentes jogadas com personalidades talentosas. Ocultas.

Enfim o jogo chega ao fim.

O Coringa surge apenas para capar o Ás de Ouros.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Marionete


O cabo ligado em cordas disfarçadas de seda movia todos os seus membros, acionando braços e pernas sem vida de si, mas outorgada a outrem como se fosse um ímã. A sensação de ser um títere, cuja personalidade se foi há muito, ou talvez nunca tenha se estabelecido, foi relevante para que a dança de marionete se fundasse.

Em um levante de dedos todos os comandos em alta com a cabeça se agitando e sendo obrigada a enxergar a demanda do autor.

A situação se movimentou em muitos e certa fraqueza assolou o articulista que começou a derrear comandos, deixando o marionete por sua própria conta.

Acovardou-se, o pobre, na batida ligeira de todos enredados. Fugiu.

Atirado ao solo, sem as amarras que lhe montavam a carcaça e livre dos cabos que lhe concediam o movimento autorizado, recuperou sozinho sua identidade roubada, por um período, com seu próprio consentimento, diga-se a verdade.

Um pouco resvalado e ainda com a sensação da linha de força a lhe enlaçar, lá se foi o marionete.

Em direção a si mesmo, por enquanto.

Gosto amargo

  Girei os calcanhares com gosto amargo na boca travando meu raciocínio para reconhecer o espaço de tempo que ocupo desde há muito e que hoj...