terça-feira, 11 de abril de 2023

Clube Riograndense / Montenegro / Sem memória, sem história

Deparei-me com um impasse nesta manhã, quando o sol nem havia dado as caras e eu ainda não tinha me localizado no mundo e, como muitas vezes acontece, pensei em acompanhar meu espírito com uma curiosidade infantil para verificar aonde ele me levaria a navegar, se pelo passado caudaloso em histórias ou se ateria ao momento presente entremeado de sonhos e expectativas, algumas reais outras sem proposito. 

No filme que se apresentou a mim, colorido e em câmera lenta escolhi o episódio que acompanhou meus passos da adolescência à menina-moça: o Clube Riograndense de Montenegro, um edifício com uma feição dos anos 1800, com o propósito de ser um Clube Social, onde as famílias e seus descendentes usufruíam de um espaço onde acontecia a celebração de eventos como Aniversários, Casamentos, Baile de Debutante, Baile da Primavera, Kerbs e Reunião Dançante nas tardes de domingo.  Memoráveis lembranças. 

Veio até mim a arquitetura antiga e sóbria do edifício, sua fachada austera e bem acabada que recebia em dias de baile as moçoilas vestidas no rigor da festa e com o coração aos pulos verificavam se seu par de dança já se encontrava a postos no grande Salão. Como era de costume nos idos de 1960, as meninas ficavam apenas na espreita de que seu par as levasse para dançar. Os rapazes imberbes, envergando terno e gravata se reunia como se adultos fossem perto do bar e, às vezes, restavam ali por uma noitada inteira. 

Fui surpreendida por uma emoção indescritível ao enveredar por tais reminiscências sentindo o aroma que o Clube exalava de si no momento em que se adentrava sua porta enorme em estilo arquitetônico com corrimões sinuosos, escadarias sólidas, mesas e cadeiras bem talhadas, sofás e poltronas de couro, fechaduras de cobre, vitrais decorados, lustres e lamparinas no melhor estilo da época. 

Este era o retrato do centro social de Montenegro de 1960 onde todos se encontravam com pompa e circunstância como ocorria naquele tempo antigo e inesquecível onde todos se conheciam, compartilhavam dos protocolos da sociedade que comemorava Eventos festivos importantes. 

De repente, minha visão do passado escapuliu da minha mente e, como em um soco no ventre percebi que a alma deste prédio havia desaparecido. Sem memória, sem história.

sábado, 8 de abril de 2023

Vida roubada

 

Ela veio nas ventas de Sagitário que diz a lenda dos astros nasceu liberta como passarinho do mato, coração como ave gigante que anda por todos os céus planando aqui e ali, porém seguindo o curso dos ventos sem muito olhar para trás muito menos para os lados, indo em frente amenizando todos os desafios que possa encontrar. 

Mesmo ainda menina sentiu a flecha do centauro esburacando seu coração e desde aquele dia nunca mais se desprendeu do feitiço animal que tomou conta de sua vida, inebriando as condições de afeto praticamente sem possibilidade de arrancar a condição sentimental que havia se instalado de maneira definitiva quase como uma patada de cavalo que nunca cicatriza. 

Foi desta maneira bem lúdica que o tempo foi passando e moldando em um feitio único uma vida qualquer, uma existência comum, um andarilho de Deus seguindo seu caminho com fé que as escolhas são definitivas e que assim acomodada à vida vai tendo seu curso, às vezes com mais pressa, às vezes com mais vagar, mas para o centauro ilustrado o potreiro com cancela lacrada a sete chaves dá uma sensação de segurança e de para sempre, mesmo que mais adiante aconteça o contrário. 

O dia nem tinha amanhecido a pleno quando a porteira que enquadrava a vida já passada em anos escancarou-se deixando como ferida aberta todos os propósitos alinhavados, esfarelando a perspectiva de enquadramento único em uma combinação, desamarrando com facilidade os nós preciosamente colecionados durante tantos anos. Restou ali, no chão batido de um coração partido o centauro com patas, ventas e flechas inerte.

sexta-feira, 7 de abril de 2023

Paixão de Cristo

 

O dia amanheceu orvalhado da noite escura, sem estrelas e com uma calmaria anunciando que o dia de celebração da Paixão de Cristo estava acompanhado do pensamento cristão que neste dia manteria suas falas em silencio, a musica profana baixaria o tom se unindo ao sossego respeitoso instalado como prece ao sofrimento e sacrifício de Jesus Cristo pela humanidade. 

A estrada percorrida estava eivada de pedregulhos, raízes, galhos secos assim como o tempo era soberano em açoitar Cristo em sua caminhada, porém, em nenhum momento deixou de seguir em frente em seu propósito de fazer o bem, perdoar as ofensas e salvar a humanidade que se perdeu por entre vários caminhos. 

Em sua peregrinação arrebanhou uma multidão que acompanhava o Mestre com devoção e ouvia seus ensinamentos reconhecendo todos os milagres que dia a dia iam acontecendo frente á população que vivia sem esperança. Cristo trouxe o brilho da Fé a todos que o seguiram e ouviram suas palavras como sendo o Filho de Deus. 

O clima se curva ao simbolismo deste dia em que Jesus Cristo chega ao final do caminho pontilhado de traição, duramente percorrido e agora jaz pregado na cruz, com a carne dilacerada banhada em sangue deixando entrever seu olhar de ternura infinita por todos os seres humanos o qual deu sua vida prometendo voltar. 

E então, no terceiro dia após sua morte, vestido com brancas vestes e com todas as suas feridas cicatrizadas, ele rasga a atmosfera e sobe para se sentar a direita de Deus Pai. Aleluia.

domingo, 2 de abril de 2023

As marcas da secura

Ansiosa, fico perambulando pela casa de porta em porta, de janela em janela, inspirando os ares quentes para ver se consigo sentir que a mudança obrigatória do clima já esteja com a mala afivelada aguardando a chegada do Trem do Litoral o qual deverá embarcar sem demora e sem mais delongas uma vez que todos os narizes praieiros aguardam por ventos mais frios. 

As marcas da secura estão com suas cicatrizes à mostra sangrando poeira e pedregulho, travando córregos, aborrecendo sementes e murchando as flores das mais resistentes levando a natureza a se manifestar com estardalhaço para que os ventos e as águas mais frias aconteçam com presteza por estes lados. 

É tempo de fechar o guarda sol, guardar com erva-cheirosa cangas e biquínis, retirar da vista o chinelo de dedo, abandonar bronzeadores, secar ao sol ainda quente a bolsa térmica de praia repudiando, por ora, o tempo etílico e sumir com as cadeiras que já denunciam ferrugem do período. Enfim, esperar o desejado tempo fresco que se avizinha com a pompa e circunstância que merece. 

O espírito se prepara para ouvir o silêncio que se instala nas asas do vento da deliciosa mudança que se aproxima, torcendo para que a balburdia seja deixada para trás, como um traste mal visto, uma ocasião fora da curva que traz o desequilíbrio da proposta da estação de descanso neste pedaço de chão abençoado que usufrui da passagem marcada das Estações do Ano. 

Ele chegará em breve, diz o meu Barômetro. Como lhe é peculiar, virá calmamente, primeiro iluminando com luz muito clara o dia, arrefecendo as ondas do mar, molhando bem devagar o chão batido do verão passado, dando sustos mais frios alternando a brincadeira com o sol abrasador que não perde a mania de ser o Rei. Todos a postos. Ele virá.

Gosto amargo

  Girei os calcanhares com gosto amargo na boca travando meu raciocínio para reconhecer o espaço de tempo que ocupo desde há muito e que hoj...