sábado, 17 de julho de 2021

O ciclista

  

Basta a decisão de jogar-se no selim e dar tratos às pernas que deve se mexer em cadência que melhor aprouver e seguir em frente de orelhas em pé, sorriso no rosto e semblante combativo porque o que vem pela frente pode ser vento cruzado, sol queimando a mufa, chuvisqueiro fora de hora e os percalços do caminho que mais parecem solavancos inevitáveis que a vida apresenta, porém, tudo isso desaparece como em um passe de mágica pelo único motivo que o corpo adere à si a natureza e como máquina perfeita já começa a trabalhar para deslocar a loucura que por qualquer motivo já se instalou em seu sistema como se fosse erva daninha e assim de pedal em pedal avança para o caminho que se abre à aventura. 

O passeio se inicia com o reconhecimento do terreno em frente que briga o tempo todo com os olhos que querem navegar em ritmo menor na observação e encantamento da paisagem que quase nunca é percebida quando percorrida célere e cegamente para lugar nenhum, para resolver o que resolvido está, para achar o que nunca apareceu, para lembrar o deletado, para encontrar a conversa sem noção e finalmente voltar ao ponto de partida arriado de intenções, moído e tonto por não haver enxergado quase nada do caminho. 

O caminho das duas rodas não tem muita importância porque muitas vezes se segue o nascer ou o por do sol, o quadrante ventoso que melhor convier, a temperatura ideal escolhida a dedo no patamar do dia que nasce ou termina, o  corpo se mexendo de maneira automática e esforçada para vencer a si mesmo, muitas vezes, com respiração e bate-bum do coração em cadência perfeita com o ritmo do mar. 

A cabeça ao vento dá sinais de alienação momentânea do entorno que passa em câmera lenta atentos ao caminho desviando com alegria dos percalços, fazendo força para subir e rindo muito na descida. Assim encontra-se um estado de alma mais infantil, brejeiro e sorridente para começar ou terminar o dia.

Um comentário:

m.reginasouza68@gmail.com disse...

💟 Liberdade definida sobre duas rodas.

Gosto amargo

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