Como não consigo mais arrumar a minha cabeça,
seja por incompetência, preguiça ou enguiço da máquina, resolvi abrir caixas,
gavetas e o mais que esteja – organizado ou nem tanto – para fuçar com calma e
verificar o que é excesso e o que não é. Ando assim ultimamente e o maior
perigo é que somente eu fique dentro de casa ou o contrario, eu vou e todos
eles fiquem sendo esta claramente a probabilidade maior.
Enquanto isto não acontece minhas mãos voam
nas entranhas do domicilio causando em mim um sentimento mórbido de arrumação.
Parece-me que o simples ato de buscar o escondido me libertará do que aparece o
qual não faço gosto nenhum de me deparar. Assim vou seguindo, saltitando entre
papéis, livros, embrulhos de preciosidades, descobrindo objetos na fila de
espera de se exporem nas prateleiras da casa.
Dou um tempo às janelas abertas e as oculto
do meu olhar me concentrando no que está por vir de concreto neste quadrado.
Parece cacoete de gente isso, sempre com olhar na frente na ânsia de prever o
que virá e custa um pouco se acostumar com o agora. O momento instante nunca soa
com a perfeição que merece e o para e anda acontece como se viver fosse apenas
isso.
Vou dando cabo da tarefa e para minha
surpresa não remeti para a porta da rua nada. Aos meus olhos tudo tem
serventia, o que desembrulhei me trouxe lembranças que em alguns casos nem
minhas eram, porém traziam ocasiões vividas de tempos remotos, com outras
pessoas, outros lugares, acervo que veio parar em minhas mãos por força da
redistribuição normal em família. Pensei um pouco mais sem despregar os olhos
dos artefatos e achei, naquele momento que, além de acumuladora de emoções
virei, da noite para o dia, acumuladora de coisas.
Não me dobrei a este instante fugidio de mea culpa porque um acervo conta
histórias reais e inventadas no escuro de uma casa e eu preciso delas assim
como necessito de ar, água, café e vinho. Na ordem.