sábado, 28 de abril de 2018

O vacilo da luz



Aconteceu que naquela manhã, justo naquela, o dia estava iluminado e de tão ensolarado carecia de apertar a vista para enxergar tudo o que se apresentava desde coisas minúsculas e sem importância maior no comum dos dias até as mais relevantes como, é claro, a vista imutável para o mar. Imutável que se diga, porque ela não muda no enquadrado da janela, quem se solta para outras veredas é sempre o oceano. Mas enfim, tudo estava encaixado na grande angular do dia e assim o que era bacana e também o que era mal visto apareceu ali, naquela lente deste dia claro.

Mas o destino – sempre ele – naquela ocasião estava de maus humores e o dito cujo na mira não conseguiu enxergar o que o nascer do dia apresentava. Na normalidade abrimos os olhos e vamos andando em frente desviando dos obstáculos que nos aparecem com destreza, esperteza e visão boa. Mas não foi bem assim. Não foi.

A escuridão se instalou sobranceira nos olhos de quem sempre enxergou, quem sempre teve uma boa pontaria, para quem apertar e arregalar o olho era a tarefa mais simples do mundo. A vida com determinado senso surripiou este poder e assim sumiu a capacidade de verificar em que plano se movimentariam seus pés, porque a visão é quem os conduz e foi assim que a escuridão passou a ser seu guia e com ela ele deveria se haver.

Privado de luz que garantisse imagens normais na rotina, foi de certo modo sem querer, que o olhar voltou-se para dentro, e assim a viagem começou na sua mente como se voltasse ao passado, ou como se tivesse uma noite com tantos sonhos que de repente tudo parecia real. A viagem nas lembranças recentes e outras nem tanto distraíram o destino imposto e assim foi se acomodando a retrospectiva para que, em primeiro lugar, não se perdesse a esperança de a luz voltar. Quanto mais o filme da memória rebobinava, mais interessante ficava o caminho. Com tantos enigmas e imagens a lhe fazer companhia ficou fácil prever o que estaria acontecendo ao redor e deste jeito foi se alinhando o que parecia agora lhe pertencer: a imaginação. A surpresa fica por conta da vida. Ela tira, mas eventualmente pode remediar ou devolver. Desta feita a luz se fez. Aleluia.

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