Fechou o tempo com nuvens baixas e riscos
dourados cortando o céu que hoje se oculta deixando as cidades em sombras e
recebendo também todas as lágrimas do universo, alagando bueiros, varrendo as
calçadas com muita disposição. O pisca-pisca dos raios além-mar constata que o
clima não está para brincadeira e achou por bem se indignar, revogando por hora
os dias luminosos, as caminhadas solitárias, e a fervorosa olhada no calendário
para ver se perto está do tempo quente, dos ventos airados, da correria da
areia fina, das borboletas de verão rondando os hibiscos, das cabeleiras se
emaranhando por gosto nas cabeças mais rebeldes.
A natureza resolveu dar um basta na farra do
sol e com este jeito tão peculiar de escurecer o dia, quase parecendo noite,
deita o medo e a apreensão nas ruas. Não há sombra do aparato e tudo se recolhe
com vitrines medrosas e levemente envergonhadas ao expor em suas calçadas,
guarda-sóis coloridos, cadeiras de praia, cangas multicoloridas, espetos para
churrasco e mais quantas mil quinquilharias que agradam veranistas. Recuam os
varejistas apostando agora que a chuva fina lembra galochas, capas de chuva,
sombrinhas e na gastronomia a carne gorda e a sopa galgam seus lugares na chuva
de outono.
O mar se achocolatou de vez derramando suas
águas barrentas até o calçadão jurando solidariedade aos raios e trovões que
esboroam sua alegria por estarem assim todos unidos na revolta climática - e já
não era sem tempo - pensa a natureza.
A cachorrada de rua acua por todo canto sem
destino, sumindo como por milagre da vista dos moradores que lhes cuidam em
suas portas e lhe provê a comida e a água diária. São os guardiões de tantas
moradas, fiéis seguidores de seus donos desconhecidos que por mais que se
esforcem no carinho e cuidado fica impossível mudar a triste feição do
vira-lata, adquirida em função do abandono. O tempo fechado agrava a situação
da malta.
A fantasia fora do contexto surge com a visão
da moçoila corajosa, que desafia o frio, a chuva e o oceano gelado, se
conjugando em um retrato perfeito da esperança que move o praieiro, mesmo em um
dia com um céu tão barulhento.
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