Assim, de passagem, não me dei o desfrute de
reparar naquele sorriso caído no chão, escarlate como sangue querendo dizer não
sei o quê. Como não aparece escancarado, pode ter sido jogado ao chão antes que
se abrisse e quiçá o dono do mesmo achou por bem tirá-lo da cara por sentir-se
afrontado com a alegria rouge que dele emanava, mesmo
com certo sentido amoitado.
Mas, voltei no caminho e me deixei levar
pelos detalhes da figuração que me espelhou uma coisa sendo outra e, com que
facilidade me ocorreu tantas estórias para uma mesma questão. Neste sorriso que
prendeu meu olhar, eu vi que de fato era um rosto sem a composição de face completa,
pois não tinha olhos, nem nariz, nem sobrancelha e, claro, sem expressão. Mas
ao mesmo tempo a figura quase surreal me trouxe tantas suposições que acabei
imaginando que o dono desta tristeza pudesse voltar atrás e resgatar os lábios
tão negligentemente abandonados na rua.
Ele pode ter ouvido tantas promessas falsas,
tantas conversas sem ponderação, tantas noticias sem sentido, tantas piadas de
mau gosto que houve por bem desfazer-se de sua boca, assim ela não lhe engana
em nenhum momento de desatenção. Agora talvez ele se sinta mais aliviado porque
com um semblante que não se atraiçoe fica mais simples enfrentar o dia a dia,
mais prático não responder perguntas, mais interessante somente ouvir, mais
charmoso sorrir, pedir e conquistar com os olhos. Os diálogos terão que ter
mais tempo para serem travados uma vez que a acústica da discussão se evadiu e
não irá reverberar respostas prontas, hilárias, aborrecíveis ou malévolas. O
silêncio vai enterrar o que não tem proveito.
A brisa soprou com suavidade e fechei os
olhos para senti-la. Ao abri-los procurei o fio da meada da minha estória e me
defrontei com uma linda folha da cor do outono em um piso de cimento. Que
coisa!
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