Começa devagarinho, como deve ser, vai
gelando os pés e as mãos e depois avança vagarosamente tomando de assalto nosso
corpo que andou nos últimos tempos sem nenhuma vergonha na cara, despido,
andando por ai como se pouca roupa frente ao olhar do próximo diminuísse a
temperatura.
Agora vai se achegando, e, como não quer nada,
adentra pela janela semiaberta aquela brisa fria da manhã que atiça os
sentidos, arrepia nossas entranhas e faz com que nos abracemos a nós mesmos com
delicadeza e depois corramos para lançar mão do agasalho. Este, quanto mais
largo e esfarrapado, melhor, porque aquece nosso coração e nossas lembranças.
Vai que ele foi tricotado por alguém muito querido que não mais se encontre ao
alcance dos olhos ou, talvez, ainda rescenda ao cheiro da pessoa amada que se
enlaçou a você quando decidiu dar outro rumo na vida, deixando para trás, nas
felpas enroscadas do velho casaco, sua marca e seu cheiro que agora age como se
fosse o amaciante daqueles momentos em que se aqueceram juntos.
As mantas são tiradas do armário com presteza
porque são elas que vão incorporar o termômetro da friagem, da ventania e da
chuva. Vão se enrolando em nós conforme sua textura e cor aquecem e resfriam
conforme o sol aparece e some quase sempre do nada. Elas gostam de se
diversificar em cores acompanhando o humor dos seus donos que as enlaçam em nós
românticos nos pescoços e ombros, aquecendo a fala e o abraço.
As mãos que órfãs estão de carinho, recebem
vistosas luvas, talvez para fazer um alarido de socorro demonstrando ao povo
que elas estão precisando de calor humano. Os pés enregelados bailam a mesma
dança ficando mais difícil toda a manhã abandonar seus companheiros de sono,
seu cobertor de pena de ganso, seu lençol térmico, suas meias ou os pés do seu
amor que delicadamente, toda a noite, se envolve na quentura que o frio sempre
traz.
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