quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Chip


Vinha sempre do mesmo lado aquele sopro, minando o ouvido, carregando com força a pressão. Cabeceava tentando me livrar da intrusão, mas sempre parecia que ficava pior e então eu me entregava àquele zumbido monocórdio que tinha tantos tons quanto o silêncio do entorno podia retratar. E foi nesta hora que eu percebi um tom que se revelava sempre igual em dados momentos, como se a mim quisesse alertar para algo, alguma coisa ou fato.

Acabei pensando que eu talvez houvesse me esquecido de alguma coisa do passado, vai que agora é moda alinhar-se ao ocorrido ao invés de apenas olhar para a próxima pedra que deverá ser desviada, vai que não me dei conta que alguém esta achando que muita coragem não é tão boa assim. Pode ser que o meu anjo da guarda esteja apreensivo com algo que não estou vendo e deste jeito meio torto está querendo me chamar à atenção.

O aviso deve ser serio e pode ser que eu não tenha prestado atenção e agora querem entrar a todo pano dentro da minha cabeça. Logo agora que apaguei alguns chips mais antigos, arranquei os contatos de outros, parti em dois os mais novos e pisoteei uma boa parte. Lembro bem da faxina tecnológica que me atacou em apenas um dia e do resultado que este impulso ocasionou.

Passei a receber na minha cachola apenas múltiplos avisos, novinhos em folha, todos com um alerta de acordo com a importância, deixando o irrelevante totalmente fora do meu alcance provando que a manutenção que eu fiz estava dando resultado. Os componentes em que guardei os esqueletos mais arrepiantes estavam em local secreto porque fazem parte de uma história que não pode desaparecer, mas também não precisa ser atuante ou em todo momento romper as ideias inovadoras que são do agora.

Em pequenas caixas eu guardei outras coisas que não se deve esquecer e muito menos colocar fora, então não consigo enxergar o que está faltando dentro da minha cabeça que já não tenha sido inventariado, classificado e colocado em seu devido lugar com um capricho diário de ter em mente que de agora em diante tudo será diferente. Voltei atrás para rever as decisões, a varredura contumaz que me atacou e encontrei num canto jogado um chip bem antigo, cheio de pó. Dei uma limpada nele e coloquei numa vaguinha bem aqui no lobo frontal e ao ativar-se vi que saiu dali correndo a tristeza, instalando-se avidamente a felicidade.  

Nenhum comentário:

Papelaria em dois tempos

  Não sei quem me encontrou primeiro, se aquela papelaria antiga ou eu, que ando gastando a sola do sapato atrás de quinquilharias que lembr...