terça-feira, 20 de setembro de 2016

Linha cruzada


Um alô! simplório abre uma porta radiofônica e muitas vezes entra uma linha cruzada sinistra e deste jeito se estabelece uma conversa de loucos como tantas por aí, se entrelaçando misteriosas e desconexas para o não convidado, que busca entender aquele diálogo que surge no meio de um dia em que a intenção era buscar uma conversa alhures com alguém, que inclusive já aguardava a ligação. Mas o destino foi mais forte e levou para longe o propósito.

Emudecer de curiosidade e ficar ouvindo o que os outros falam como se fosse premente estar ali, coloca na vista uma onda magnética de indiscrição e medo. Sem nem respirar, o intruso engole as estórias alheias e os mexericos obviamente incompreensíveis para quem está de fora. Telefonemas anônimos eram comuns e a paixão platônica surgia através do timbre de voz e assim se derretiam as fronteiras do cuidado e arrombava os contos absurdos fazendo reféns do fio condutor da conversa alheia.

A baliza de intersecção de conversas evoluiu com a destreza e descaramento inominável tornando desconhecidos, alvo e pontaria, unidos e separados, ativos e reféns, que negligenciam o propósito da troca, que escarnecem da realidade se formando uma massa crítica para o que vier. Sem acordo, sem proposta e com a única bandeira de si.

Por onde anda a verve que reúne uns tantos em torno de vários e que, para que haja entendimento, cada um tem a sua vez de se posicionar, de falar com as mãos, de vociferar com os olhos, de pensar em segredo, de respeitar sem se imiscuir, de gingar o corpo todo fornecendo assim a teatralidade do conchavo, refrescando as ideias, alegrando o convívio, articulando novos temas.

Em nenhuma praça os encontros misturam o apoteótico da razão com a vivacidade do discutir, do dilacerar argumentos com tanta abundância que os posiciona em mergulhos profundos de oportunidades. Várias leituras para tantos temas. 

Nenhum comentário:

Papelaria em dois tempos

  Não sei quem me encontrou primeiro, se aquela papelaria antiga ou eu, que ando gastando a sola do sapato atrás de quinquilharias que lembr...