Deitado na maca com seu corpo em mil pedaços
facetados tinha apenas a pele guerreira lhe ajuntando como se fosse ela, neste
momento, o único elo de esperança. A morte, bafiando a nuca do coitado
estirado com os sentidos já amornados ouviu a recusa de seu convite, por ora.
Seu olhar de azul celeste se agrandou, apertou, movimentou-se
no entorno e lentamente seus cílios se sobrecarregaram tanto que ele foi
obrigado a seguir o pedido do corpo, quentinho do trauma. Cerrou os olhos e se
foi.
Não sem
antes dar uma espiada na vida que lhe queria passar a perna e se aperceber que
talvez fosse melhor negociar.
É nesta hora do coma que a matéria e scangalhada do pobre se
abre às mil parafernálias médicas terrenas. Tanto osso quebrado, tanto desvio
do esqueleto, tanto sangue para drenar. Os músculos, outrora fortes se deixam
ficar derreados porque seu bravoso dono não está ali para lhes dar alma e
treino forte para se fortalecerem.Todo o bucho assim se comporta, sem coração
batendo pelo seu sangue quente e ousado, estômago e afins na carência do
alimento que seu dono aguerrido costumava lhes servir. Todos lhe sentindo a
falta, ora veja. Todos em compasso de espera do indivíduo que agora está sob o
comando de máquinas, fios, cabos, sinais em telas, seringas, agulhas, plaquetas
de aço, porcas e parafusos. Uma vida por mil cabos.
Não acaba aí a vida em suspense do herói. É neste momento que
começa a negociação e seu espírito é buscado e conduzido pela equipe mais
perfeita do Universo. Começa o tratamento, propriamente dito.
O corpo desfeito como uma carcaça vislumbra um sopro de vida
neste lugar onde gravitam os socorristas que estimulam a brasa de vida que
persiste no espírito deste homem. Assim lhe são feitas muitas perguntas, deste
modo lhe são dadas muitas opções e também muito tempo para pensar. Ele se sente
bem cercado de cuidados de todos os níveis passando de sala em sala, de
hospital em hospital com vários profissionais que, juntos, ajustavam sua vida.
Negociavam com ele. Que oportunidade! A tarefa agora estava quase cumprida, e
sua cura dependia de querer viver.
Não só de existir em si, mas de conhecer quais seus
propósitos reais neste lugar chamado Terra, de sua utilidade para sua família,
amigos, filhos e humanidade de uma maneira geral. Abdicar de seus sonhos
buscando outros em seu lugar. Escolher outra perspectiva porque lhe sobra muito
tempo. Adiantar planos antigos e colocá-los em prática. Visualizar que existem
outros caminhos fora os já trilhados. A decisão era sua. Ficar ou comparecer ao
Juizo Final. Abriu os olhos.
Escrever para viver e viver para escrever. A inspiração é o meu objeto de desejo a cada amanhecer e assim minha alma fica fortalecida no encontro do silêncio e da natureza marítima. Leiam com bons olhos! Mail para contato: verarenner43@gmail.com Vera Lucia Renner
domingo, 20 de março de 2011
Coma
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4 comentários:
Fantástico...estou toda arrepiada. Parabéns, bom domingo.
Bjs Carmen.
Excelente, Vera. Eu nunca me aventurei em ficção, necessita um esforço imaginativo que duvido que tenha. Só sei escrever relativamente bem sobre não-ficção... os looooongos documentos e análises que, na verdade, por vezes, são pura peça de ficção também...rssss... Parabéns!!!
Esse post me lembrou o filme "Johnny Vai à Guerra". Já viu? Caso não, VEJA!!! Não é recente (acho que dos anos 90), mas se consegue numa boa locadora cult.
Beijos!
Hélio Z.
"Coma " pede densidade e está na medida certa . Como consegues ? Resposta : talento . Bjss. Marilda
Vera, esta texto vai por outros caminhos, diferente dos que já andaste. Quanta tensão e emoção inspiram estas palavras! Beijos.
Maria Rosa
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