A mudança de endereço é uma prática comum nos dias
de hoje com gente indo pra lá e pra cá em busca da casa própria, do conforto,
da felicidade, do espaço prometido, da terra do nunca e da segurança e não sei
mais que tantas mil outras necessidades.
Me surpreendo toda vez que alguém sai do meu prédio...Eu
falei alguma vez com esta pessoa? Quem é esse individuo que arregaça meus
portões e descarrega em um caminhão toda sua tralha e posses deixando os
corredores com tantos sons e um apartamento vazio, coitado, chorando a ausência
dos donos?
Este espaço agora tem pela frente que sofrer a partida e se
recompor para receber novos moradores. Vão respeitar suas paredes? Seus cantos
e recantos? Suas estruturas? Irão rasgá-lo com reformas? Vão feri-lo com pregos
imensos para pendurar objetos insólitos?
Mas nunca pensei na surpresa da saída de um vizinho de mais
de 23 anos. É isso assim mesmo. Porta a porta vendo seus filhos nascerem e
crescerem sem nunca privar da intimidade da família. Coisa da raça alemã.
Conversas ocasionais de corredor, o tempo, o condomínio, não querendo ninguém
se aproximar e assim correram todos estes anos. Numa manhã este vizinho vai
embora sem uma palavra, sem um bilhete, sem um telefonema .Mais de vinte anos e
fico achando que ninguém é normal.
Na verdade este episódio foi o start para que me me
encorajasse a escrever...Tem dois anos. Nunca é tarde
Escrever para viver e viver para escrever. A inspiração é o meu objeto de desejo a cada amanhecer e assim minha alma fica fortalecida no encontro do silêncio e da natureza marítima. Leiam com bons olhos! Mail para contato: verarenner43@gmail.com Vera Lucia Renner
sábado, 14 de junho de 2008
Caminhão de mudança
As novas ruas engolindo as emoções
As ruas do meu
bairro mudam de aspecto mais rapidamente do que eu possa acompanhar.
Residências desaparecem e espigões se lançam aos céus numa velocidade voraz.
Nas minhas andanças vejo casas caírem lentamente sobre o
martelo de operários que insensíveis destroem tijolo por tijolo o lugar,
deixando desnudas as emoções que permearam anos de vida de uma família. Quantas
conversas nos corredores, discussões do dia a dia, amores compartilhados,
cheiros das estações do tempo e da comida diária. Cheiro da família, chinelos
se arrastando, gente rindo e tossindo, familiares partindo.
Acompanho atônita como se fosse um filme todas estas energias
pulsantes que pairam sobre este lugar que agora não é mais nada. Vagam no
entorno se perdendo, e para onde esta gente foi esta fase talvez não os
acompanhe.
Sem nenhum pudor a intimidade da morada é deixada à mostra e
descoberto os azulejos daquele velho banheiro que viu tantos corpos nus,
gelados, quentinhos, jovens, velhos e desolados talvez. Lágrimas escondidas num
espaço que é privado e santuário para muitos. E me aperta o coração.
O carvão da velha churrasqueira no jardim ainda cheira e ouço
risadas de uma reunião de domingo. No abandono, uma banheira de porcelana cheia
de inço, ridícula e bela na sua falta de propósito depositada naquele charco e
não em seu lugar de origem com velhos azulejos e vapores fumegantes de uma sala
de banho antiga.
E as paredes vêm abaixo sem dó com a história desta família
se desfazendo no chão junto aos últimos cacos de tijolo, argamassa e azulejo
picado mil vezes. Renascem novas em outro lugar, ou não.
E o meu coração se aperta e choro.
quarta-feira, 4 de junho de 2008
Trilha do boi
Sempre que ouço
falar em trilha me vem à mente, mata fechada, subidas, terra molhada,
escorregadia, espinhos, insetos, aranhas, galhos e raízes a te assaltarem sem
cerimônia com a soberania de quem faz o caminho.
Até ser convidada a fazer a Trilha do Boi, no Itaimbezinho,
era esse meu pensamento.
Diante de mim um caminho descomunal de pedras. Uma trilha
construída pela força da chuva que atravessa implacável os cânions, arrastando
tudo consigo sem levar em conta o lamentar da natureza viva. As pedras rolam e
se repartem em muitas deixando à mostra suas entranhas e, finalmente, se
organizam em novas formas e cores no leito do rio, banhadas mansamente pela
água, agora, cristalina.
Este caminho, para mim, pode-se comparar a nossa vida que por
tantas vezes sofre avalanches que embaralham nosso dia, deixando um rastro de
mágoas, ressentimentos e sofrimento. Estes mesmos eventos vão se acomodar no
fundo da nossa alma para nos fazer ressurgir mais maduros e fortes para
enfrentar o crescimento emocional que todos precisamos ter para melhorar nossas
vidas e a dos que nos rodeiam.
Não desista da trilha da vida....
segunda-feira, 2 de junho de 2008
O homem da lata
Praia deserta nestes dias invernais com cheiro
peculiar de marisco, de ressaca do mar cor de chocolate. E de repente, um homem
sentado numa cadeirinha de praia na solidão da areia molhada e esquisita, de
pés descalços no frio de 10 graus e ventinho gelado.
O que faz este homem debruçado ao chão recortando uma grande
lata quadrada com um alicate e outras ferramentas bem masculinas...Passei ao
largo cumprimentando o desconhecido com meio sorriso receoso, tentando entender
o que ele queria com aquilo, neste local tão inusitado. Repassando, rodeando,
indaguei o que fazia ele com aquela lata..recortando-a. A resposta foi evasiva,
indireta, quase nada. Disse-me ele que estava Inventando algo para distrair e
não podia fazer barulho no apartamento...
Legal, recortar lata na praia, com barulhinho para espantar
mergulhões, garças e quero-queros...Afinal ! O silêncio não é para todos, assim
como a solidão.
Para mim o silêncio é imperativo e ensurdecedor se é que dá
para entender isso. Ao longe o rugir do mar e os meus pensamentos ora
gritantes, ora calmos, ora sem eles, que às vezes é bem bom. Esquisita eu,
esquisito o homem da lata...rodeando seu invento e fazendo barulho no silêncio,
Deixo para trás esta praia cor de chocolate com visual
indescritível para quem só conhece a praia lotada de corpos bronzeados,
guarda-sóis e cheirando a protetor solar. Esta paisagem é quase selvagem de tão
solitária e mágica. E paro de pensar no homem que recorta lata na beira do
mar...
Duas lágrimas
O dia chora mansinho se unindo a tantas e tantas outras vertentes cristalinas que brotam de olhos de todos os matizes sempre mantendo a au...

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