A morada ficava em meio a uma vegetação densa e nativa que a família, numerosa, preservava com todo o cuidado e por ali tudo que nascia crescia de maneira natural sendo este o motivo de ser um jardim agreste e organizado destilando todo o seu aroma silvestre, desde o inço até as mais belas flores que nasciam sem nome e sem dono. O trabalho de cura e resgate deste espaço surreal é feito pela bicharada que habita este pedaço de terra executando uma tarefa de cura e resgate de doenças que apenas esta naturalidade da mata nativa do Edvaldo pode proporcionar.
Neste recanto de vegetação
primorosa e rara estavam acomodados ninhos de toda espécie e todos eles eram
bem-vindos, alados, rasteiros, aquíferos, quadrúpedes, tendo o cuidado
necessário na preservação de todos, inclusive com a natureza de vida e morte
entre eles considerada e os ciclos aconteciam sem interferência dos donos da
casa que acompanhavam com respeito e atenção o que acontecia, ajudando somente
no que fosse urgente e necessário.
A família numerosa crescia,
estudava, se desenvolvia e aos poucos foram ganhando o mundo havendo cada um
deles um interesse especifico que passava longe daquela morada encravada na
cerca viva imponderável que, sutilmente, demonstrava sinais de descaso que não
foram percebidos por Edvaldo, de imediato.
Edvaldo aceitou com passividade
a evasão dos integrantes da família até porque cresceram observando a liberdade
com que era tratada esta mata. Por este motivo estava cada vez mais focado no
milagre da natureza que acontecia todos os dias frente aos seus olhos, se
conectava totalmente e assim vivia entre o nascer do sol até o anoitecer
integrado na luxuriante paisagem do seu entorno.
Entretanto, Edvaldo, apesar da
pele cansada do sol e da chuva, com a vista fraca e a mente oscilante percebeu a
relutância da companhia e a tristeza ao se deparar com a solidão invadindo sua
vida, seu dia a dia, penetrando sorrateiramente por entre os galhos das
árvores, dos arbustos, da soleira da porta, pelas frestas da veneziana, pela
grade do imenso portão de ferro que dava entrada à propriedade. Imergiu com
força na mata.
O lugar se estabeleceu como
apartado da cidade sendo visto como uma ilha exuberante de mata nativa e por
este motivo a cidade invadiu célere o seu entorno iniciando o tempo da invasão
dos córregos, do ar pestilento soprando, erva daninha robusta tomando conta de
tudo, animais peçonhentos em franca matança.
Os nativos da mata se desentenderam, sentiram mutações entre si e na sua
natureza, iniciando assim uma forte debandada do lugar acontecendo uma
eliminação natural da bicharada que se evadiu ou que pereceu.
Edvaldo continuava cuidando do
que ainda restava e o fazia bem e com muita determinação, afastando a tristeza
através desta faina diária no trato com a terra. Percebeu que o alarido dos
pássaros havia diminuído, o coaxar dos sapos estava inaudível no fio d’água
suja, o beija-flor voava sem destino e os alegres formigueiros de calçada
desapareceram. Havia dentro dele a suspeição do fim e assim aconteceu sem
surpresa a vinda dos familiares que surgiram através daquele portão centenário,
envolvidos em uma bruma cinza, seca e suja e o convidaram a se estabelecer em lugar
mais apropriado, segundo eles. Sem os perigos da cidade, dos bichos, do sol,
das águas em demasia ou escassas. Um dia
depois de instalado em sua morada coletiva Edvaldo foi encontrado sem vida,
sentado com altivez em uma linda poltrona de vime branca, instalada embaixo de
uma árvore com aparência chorosa, como ele. Deus escolheu a dedo seu destino. Voilà.
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Lindo!
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