quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Sequestrados

 

Coloquei o pé na rua, olhei para um lado e para outro, olhei de novo e de novo e novamente e não encontrei uma pessoa sequer para dar meu bom dia, afinal, imaginava que a partir da porta da minha casa para rua a existência corria igual ao que sempre fora, a não ser que a noite escura tenha vindo abordar sorrateiramente o meu modo de discernir o mundo de hoje e viver a vida.

Vida essa que neste dia iniciava com a luz do sol a pleno, o trem apitava com fôlego, o padre chamava os fiéis com o valsear do sino, os namorados arrulhavam pelos muros, as crianças corriam atrás de uma bola ou ziguezagueavam em suas bicicletas e as avós colocavam seus aventais ensaiando com a vizinhança seus falatórios do dia.

Percebi que esta era apenas a imagem do meu cotidiano que insistia em tomar conta do meu espírito talvez porque não era mais possível andarilhar por entre desumanos sequestrados dos seus sentidos mais básicos de convivência, de perfis emoldurados como bonecos de cera que seguem como autômatos teleguiados por ondas eletromagnéticas, não tomando ciência se existe algo importante além deles mesmo mergulhados em múltiplas telas com formatos diferentes para si ou para ninguém do outro lado.

Com assombro ingênuo caí em mim da realidade caricata que circundava os lugares, os mais variados, os mais populares, os mais ermos, enfim, a vida como ela era acabou de ser sequestrada por seus próprios protagonistas.

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