domingo, 29 de maio de 2022

Indecifrável

Não prestei muita atenção no entorno e muito menos no caminho que me persegue sem folga, mesmo que eu tenha colocado na beira da estrada sinais relevantes e airosos de desvios, esperançosa de que me leve a outros lugares, pode até ser mais sombrio, enfim, que seja, afundar o caminho das pedras não me afasta da mesmice instalada pelo tempo vagaroso cheio de desconforto que todo santo dia se apresenta à mim.  

Nada disso que se oferece está colado em mim como craca de navio, ando agora num requebro bem balanceado a começar pelo meu próprio pensamento que já não se apodera da minha alma cansada com avidez impertinente num atropelo incauto e, se isto acontece, respondo com a peneira do discernimento que mesmo avariada e com remendos de ferrugem, persiste em me acompanhar. Sempre dou ouvidos a ela. 

Uma vez que a trilha está ali na minha frente me dando as ordens do dia dei-me conta que já está mais do que na hora de fazer uma variação e quem sabe vestir aquele Avatar guardado a sete chaves na minha cachola e sair por ai provocando as almas que vagam sem destino como ora me impõe a minha secreta vontade. 

Retirei com carinho a indumentária do meu pensamento e a vesti com galhardia e me fui dia afora com a cara e a coragem de sobreviver ao caminho apresentado como se fosse esta a minha única opção, por costume, por ignorância ou covardia. 

As cores voltaram à minha face e assim me apresentei à vida neste novo dia que nasceu desafiando meu pensamento para frente e para trás. Assim que me disfarcei entrei correndo naquele desvio que eu havia, somente agora, percebido e, deste jeito mais leve fui descobrindo segredos que deixei para trás sem querer, mas, que restavam em mim, apesar de tudo.

domingo, 15 de maio de 2022

Aquelas três

Sempre foram três as maletas que me acobertavam no para lá e cá com distintos conteúdos que sequer conversavam entre si, obviamente porque o que ali era depositado não podia ou não devia se misturar, e assim fiquei sempre livre para deixar uma, duas ou as três fechadas e sair por ai sem bagagem, sem roupa adequada e sem comunicação, aliás, uma estripulia bem ao meu gosto. 

O alforje maior é o que comporta toda a traquitana comunicalóide da rotina entra dia sai dia, a que mais pesa e a que mais me irrita por ser ela a dominatrix que alimenta despudoradamente olhos e ouvidos sem distinção de horário e de clima. Como ela é dependente e não tem vontade própria, ao ser acionada imediatamente rouba a vida para si em qualquer lugar e foi por este motivo que hoje a deixei fechada e assim meus sentidos ficam libertos de qualquer interferência que desvie meu pensamento do nada. Amo o vazio e o silencio porque a companhia dos meus fantasmas instiga a percorrer outros rumos e andar por ai. 

A sacola de tamanho médio traz a vestimenta a ser usada e ela é pequena pela simplicidade da observação que os dias em anos andam mais rápidos do que o figurino de moda apresenta, então, abasteci meu guarda-roupa com peças que são atemporais e bem folgadas para o caso de me acontecer ir e vir no tamanho, mesmo que agora a minha tendência seja diminuir centímetro, altura e largura. Não faz mal, vou usufruir destes trapos por muito tempo porque assim como não pesa nos ombros vesti-las, não ocupam espaço no carregamento. 

A bolsa menor é secreta porque possui emplacado a ferro e fogo meu destino de seguir em frente.

 

domingo, 8 de maio de 2022

De um lugar

 

O dia amanheceu cheio de efeito que em conjunto uníssono vem beirar a minha janela, mágica por essência da natureza que se descortina generosa em todas as pontas, trazendo até mim, quer queira quer não, o que se passa lá fora. Por aqui o trinado de todas as raças se confunde com o lufa lufa do vento calmo - por ora - compondo um orquestramento entre o som do arvoredo tão estridente que custa até a se entender o que se está pensando. 

Melhor acertar o prumo da observação e continuar neste lúdico jogo de alcançar o que passa no vazio do tempo que se descortina oferecido e generoso a alternativas mínimas. 

Necessário aquiescer uma posição de alerta máximo porque no limite do que se faz o entendimento lá de fora com nuances de tão perto e tão longe poderá se descortinar a rotina iniciada pela natureza, ela, sempre ela. Vem com força da luz inspecionar a figura e o movimento que segue lento sem entender direito qual o rumo tomar, de certa forma aparelhando-se com o clima de paradeira e de pura devoção sobre o que acontece a partir da abertura deste lugar. 

Por ali sempre se descortina o incentivo aos sentidos iniciando muitas vezes apenas pelos aromas marítimos que norteiam o restante obrigando o abrir dos olhos, até então em suspenso, para conferir o que ele quer dizer. O perfume do outono na beira do mar invade sem restrição as narinas de bichos e homens querendo dar o recado silencioso da comunidade mar, sol e arvoredo que estão para sempre juntos. Resta apenas sentar e usufruir da cantilena inequívoca do lugar que busca ensinar que baixar o resfolego da vida dura se faz necessário, dia após dia, de sol, de chuva ou de vento.

Gosto amargo

  Girei os calcanhares com gosto amargo na boca travando meu raciocínio para reconhecer o espaço de tempo que ocupo desde há muito e que hoj...