domingo, 27 de fevereiro de 2022

Aquela casa

 

Deparei-me com aquela casa antiga em que habitei em minha juventude, na rua que ora se encontra envelhecida e muito bem assentada no espaço esquecido por Deus onde se estabelecera um diálogo rotineiro que funcionava como belo diapasão do bairro, parecendo que entre ruas, becos e vielas o ar era ameno, calmo e convidativo a uma pequena prosa na calçada, um tempo lúdico para risadas e roda de amigos ali em perfeita comunhão.

Estanquei o passo ali mesmo para poder usufruir da lembrança que de tão antiga se tornou nova em folha na minha mente, uma vez que por entre portas e janelas havia uma sensação de momento presente, terno, lúdico, inocente fazendo com que o passado possa surgir de roupa nova, como um milagre. A visão parecia estancada no tempo como se alguém houvesse ordenado um “Mandrake” e tudo remete ao que sempre foi, talvez, com um leve tom sépia como pano de fundo para o avanço da prestimosa hera e erva daninha. 

A casa parecia um organismo animado, com vida própria após este enredo tramado pela natureza com precisão, se entrincheirando na porteira principal deixando a casa figurar agora como uma estampa na mente de quem havia penetrado em seus cômodos com a ligeireza da mocidade. 

Afastei-me para poder observar melhor o entorno e descobri que as residências próximas, a calçada, a rua, o tronco das árvores faziam parte do orquestramento do lugar que envelheceu em conjunto, que deixou aparente sua ferida, que buscou se igualar na temperança que o tempo fornece em sua lenta passagem. Devagar dei uma olhada derradeira para aquela fachada tramada e cadeada com resoluta paciência pela vegetação deslumbrante, apressei o passo e me afastei deixando que o tempo amainasse o rigor da minha memória naquele momento.

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