terça-feira, 2 de agosto de 2016

Comércio


Entrei naqueles estabelecimentos comerciais porque naquele dia me deu uma fome estranha e inconteste de ver e sentir as coisas mundanas da vida. Parecia que eu havia tido uma super oferta zen e me percebi definhando o gosto por observar outra coisa, fora a natureza impávida à minha frente. Observo que pode ter sido certa ressaca de felicidade. Resultou nisso um contraponto que me fizesse deitar minha atenção sobre as coisas vãs, inúteis, fúteis ou de menor serventia.

Assim fui indo de loja em loja, entrando e saindo, olhando, passando os dedos pelas superfícies, ora sentindo a textura dos tecidos de roupas de inverno, abrindo as narinas para aromas para os perfumes e beleza, ajeitando o cabelo ao entrar no salão, esticando e aprumando o corpo ao passar pela academia, olhando para os pés para conferir se estava bem calçada, aguçando o paladar nas cafeterias e restaurantes.  

Nas lojas de móveis montei toda a minha casa de novo, escolhi cada peça, medi com o olhar e tive a certeza que tudo teria espaço. Passei na loja de tecido e escolhi cortinas, colchas e mantas, os lençóis, fronhas e almofadas também foram passadas em revista. Nas variedades encontrei muitos elementos de adorno. Gostei de tudo. Reservei tudo.

Morei em cada apartamento que estava em oferta e se apresentava sem pudor na porta das imobiliárias, uma experiência de cada vez, na beira do mar, no último andar do espigão que faz sombra na praia bem cedo da tarde, nas mansões ao longo da estrada e que de praia só tem o nome, porque o cheiro do mar nem chega ali. Experimentei de tudo. Gastei minha energia para ficar com a minha mente soterrada de informação, de cores, de formatos, de novidades. Novos ares.


O lugar que deixei para visitar por último foi a livraria.  E foi ali, frente a frente com o ambiente carregado de história, as mais variadas, que o meu surto esquisito sumiu e consegui desta forma voltar a mim, me conectar com o meu propósito diário, me sentir novamente refém do teclado, da fúria na busca de ideias, do destino marcado com letras misturadas e assim, ressabiada pelo arroubo involuntário girei os calcanhares.

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