Quase sem querer,
praticamente, abri aquela porta com certo vigor porque eu precisava de ar. Ando
sempre precisando de brisa fresca como se todas as ventanias e aragens não são
suficientes para oxigenar meu corpo. Parece-me, às vezes, que todo o meu corpo
carece de ar, uma vez que ando me sentindo como uma máquina trincada, tudo ruge
com estardalhaço e então enfiando a cabeça no mundo aspirei aliviada o ar da
noite, contemplei o céu estrelado e os ventos mornos.
Quando resolvi voltar, a
porta não quis fechar. Ficou ali estaqueada, empedernida, me desafiando. Nem
que eu colocasse toda minha força ela não se mexia. Sentei frente aquela fresta
para a rua, que aparentemente veio para ficar, tentando imaginar o recado.
Dei outra espiada para fora
e não vi mais a noite, mas os dias ensolarados e vertiginosos que passavam por
mim sem que eu sequer pudesse alcançar os havidos. Havia também conversas de
final de tarde e um alvoroço do qual eu não fazia parte e me senti invisível
aos acontecimentos. Enxerguei amigos, familiares, conhecidos e muitas outras
pessoas transitando com pressa, desencontrando-se, olhando à frente, mas tão à
frente que dificilmente um olhar ali iria se cruzar. Senti o peso de mensagens
rápidas se tornarem lufadas desinteressadas, observei que de fato a conexão é
mais uma palavra que carece de sentido da verdade e assim o passa-passa do
improvável me fez recuar a vista.
Eu não queria mais olhar
para a filmagem dos dias que corriam, porque ali não encontrei ninguém de fato,
não recebi nenhum vínculo plausível, não consegui ver a vida arejada que eu
estava tentando entender através da abertura desta oportunidade que me veio
trincada parecendo um desafio.
Teimosa, encarei a porta como
se ela fosse culpada por eu ter tido uma coragem besta de ir espiar o mundo e
voltar com os olhos sem luz, sem foco e sem brilho. Resignada, empurrei de
volta o vão aberto que agora se fechou docemente, como se pedisse perdão.