Todo mundo tem um faz-tudo que nas horas mais improváveis é quem te salva. Um chuveiro quebrado, uma hydra que se descontrolou, um quadro que caiu, uma torneira pingando. Se fazes mapa astral todo ano, como eu, consulte todo o mês como esta a conjunção dos astros, pois é barreira, a quebrança estará lá, sendo sinalizada. Apronte a caixa de ferramentas e tome uma dose generosa de paciência porque o mal feito poderá acontecer em todas as conexões da vida moderna.
Vai daí que num bate-papo com meu faz-tudo que se
equilibrava na banqueta para arrumar meu chuveiro, iniciei a conversa. Primeiro
eu quis saber as novidades da rua, porque onde moro há 28 anos não enxergo
ninguém. Deve ser o horário. Mas ali estava a oportunidade de me atualizar,
pois ele, como zelador do prédio ao lado sabe das coisas no seu vai e vem de
vassoura na calçada, tudo ouve e tudo vê.
E me vem então dizer que o vizinho da frente morreu.
Teve uma coisinha de nada, foi ao hospital e de lá não voltou. Câncer. Ele já
foi me relatando que toda a sua família teve câncer e que ele, certamente, iria
“pegar” um. Então, obviamente, perguntei: e tu te cuidas? A resposta veio
direta em um sorriso largo: Eu não, quero comer, beber, viver e curtir adoidado
tudo de bom da vida.
Euzinha, escrava de tudo o que é “bom” para o corpo e
para a mente, comecei a delirar e com sofreguidão me joguei incauta ao que eu
ainda tinha tempo de fazer.
Começo na segunda-feira pelas batatas fritas, ou melhor, “À
La Minuta” com dois ovos fritos e para acompanhar, caipirinha com açúcar branco
e depois cerveja. Qualquer uma. Não importa a marca o que importa é a “tonturinha”,
como dizia um amigo meu.
Lanches da tarde com pastel, sonhos ou quindins. Um não,
todos ou vários.
Com todo o colesterol do mundo reverberando nas veias
resolvo dar uma animada no cardápio que se intensifica com doses exageradas no
café da manhã. Mando baixar omeletes e bacon frito com pão branco bem quentinho,
manteiga com sal, geléias bem açucaradas cobertas com chantilly. Frutas, nem
pensar neste frio.
Final de semana começa com a feijoada completa no sábado
com tudo que existe no porco de mais escabroso e no domingo aquela churrascada
com todas as carnes proibidas, e para aperitivo, torresmo, completando o tanque.