quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Dial da vida

 


A cadência há muito havia sido estabelecida e as agulhas do tempo se firmavam sempre no mesmo ponto, marcando com rigor o ritmo da vida de Hélio, que seguia com precisão os protocolos que a desejada trajetória havia se imposto. Ele não lembra direito o tempo exato em que os ajustes do seu futuro foram deliberados, se foi ele que muito cedo se adonou do propósito ou se o dito cujo se chegou a ele como quem não quer nada, se instalando como se por ali não houvesse alternativa, provavelmente o deixando sem saída. Ele tem para si a certeza de que a bruma do futuro não se dissipou cedo como talvez fosse esperado.

Sabia-se apenas que a batida dos ponteiros rotineiros era clara e com uma alternância de objetivos bem definidos mantendo a linha do caminho a ser seguido, não ousando ele jamais se referir ao seu trem de pouso como perseguição. Não é de bom tom acossar nada, apenas caminhar e conquistar. No inicio, ele não tinha conhecimento das pedras no caminho e se lançou com o afinco de sua personalidade a fazer e refazer quantas vezes fosse necessário o caminho ladrilhado por todos.

Todas as manhãs Hélio analisava o campo de batalha e com maestria escolhia as armas com que iria a campo, uma vez que, muitas vezes, palavras davam conta do recado, em outras a atitude firme e peremptória de quem sabe para onde vai era a escolhida. Em determinados momentos o recuo se apresentou e estrategicamente foi utilizado, mas sabendo ele que estava apenas preparando o salto. Deste jeito ia sendo feito o ajuste das pedras no caminho e as que precisavam ser removidas o eram com precisão, outras recebiam um retoque de posição e tantas se acaçapavam para que o caminho ficasse livre.

O dial estabelecido por nosso herói não se movia daquela estação parecendo que não haveria modo algum de uma posição que não fosse a apontada. Foi neste período que variáveis começaram a ocorrer e a estação escolhida anos atrás apresentava certo ruído, uma mudez persistente muitas vezes e recusa de se deixar sintonizada naquela estação ocasionando verdadeira confusão nas estratégias que se desalinhavam junto ao mundo que arfava.

A trilha escolhida dava sinal de deterioração, havendo aqui e ali exigências descabidas para o avanço deixando pasmo quem por ali transitava. A palavra e a conversa não resolvia o que fosse necessário, a soberba, o achaque e o despudor na utilização de estratégias perversas ocorriam ocasionando uma inversão de valores que muito devagar foi revolucionando o andar para o futuro.

Por fim, o dial emudeceu.

Hélio despertou com um amanhecer lento e morno e se viu sem direção ao perceber que o Dial de uma vida dava sinais de estafa, de queima de válvula  e de escurecimento do arcabouço que o mantinha ativo. Percebeu a oportunidade e foi embora.

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