sábado, 18 de setembro de 2021

O tempo cura

Agarrei-me com toda força naquele imenso relógio antigo que surgiu do nada na minha frente esta manhã, como se quisesse me desafiar frente à vida e ao mundo, talvez porque, quem sabe, de pronto não ando me importando com suas passadas de tic-tac, não autorizo que me perturbe e muito menos lhe presto atenção. Ando sempre com o olhar empinado para o céu e o movimento dos astros me guiam durante o dia, assim me colocando atenta e dona do tempo que pode dar a impressão de passar rápido, sumir de todo ou restar escondido atrás de algum acontecimento, lembrança ou emergência. 

Fiquei prestando atenção singular ao movimento que ele fazia para se aproximar, parecendo que queria fugir, se estraçalhando na atmosfera para me provocar a uma reação, tenho certeza, afinal, não lhe tenho a mínima relevância nos dias que seguem, resolvendo meu tempo com a luz do sol, a claridade da lua, o norte das estrelas, os pingos de chuva, o passeio de nuvens e trovões que ribombam de vez em quando. 

Percebi que todo este estardalhaço para me chamar a atenção poderia ter um bom motivo – dele é claro – e assim o segurei pela corrente que quase me arrastou junto e este movimento me fez perceber que ele estava de fato pensando que eu estava distante dele o que trouxe preocupação ao seu mecanismo sintomático de contar os dias e, de certo modo prevenir para que meus passos não se tornem mais erráticos como ora o são. 

Chamei-o para bem perto, pedi que não se esfacelasse deste jeito e prometi que doravante vou regular o imenso relógio da vida com os ponteiros que somente se movimentarão a meu pedido, assim volto ao passado, passeio pelo presente e sonho com o futuro em sua companhia, mas ao meu bel prazer!

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