Em primeiro lugar tirei o
fone do gancho puxando-o até a orelha para ouvir o som da linha continuado, e
depois dissonante, e imaginei a agonia de quem gostaria de falar comigo por
este instrumento arcaico e ri deles a mais não poder, em uma espécie de
histeria vingativa, pois este, dos múltiplos contatos de hoje em dia, é o que
menos mostra a que veio e por sentir tanta saudade das conversas de outrora,
foi o primeiro a sentir meu descaso.
Depois foi a vez de
desconectar o cabo da TV porque se eu quisesse me jogar na preguiça daria tanto
trabalho refazer o feito que já me tirou a vontade. Para ter certeza, virei a
tela de cara para a parede para ficar bem claro para mim, e para ela, que eu
estava de mal.
Corri ao interfone e
despenquei-o do suporte. Eu não atenderia o zelador que vem me entregar cartas,
contas, propagandas, jornais e revistas e estas ficarão amontoadas por um tempo
indeterminado, uma vez que decretei momentos de total falta de lucidez. Meu
tormento era buscar o vácuo, o desinteresse e o nada.
Do celular foi mais doloroso
me despedir, e, antes de tirá-lo do ar cravei os olhos nos não sei quantos
ícones de mensagens que atormentam meu dia para o bem e para o mal. Esta
caixinha pequena guarda os meus amores e desamores, meus esquecimentos e minhas
lembranças, minhas senhas e muita informação. Guarda meus amigos e os inimigos
também, uma vez que muitos deles não há como se desvencilhar.
Eu buscava um estado de
tédio uma vez que nos últimos tempos, esta situação de espírito sub-reptício e
até melancólico não nos é ofertado, não aparecendo na nossa agenda diária nem
nos alertas de última geração.
Após tudo feito sentei-me em
relativa paz. E devagarzinho fui percebendo que sem querer levei a mão ao lado
em busca do celular umas cem vezes, outras cem olhei para o sinal de TV a cabo,
outras idas na janela para ver se o zelador estava lá embaixo me acenando.
Também levantei o fone convencional para ver se tinha linha e insistentemente
meu olhar passeava por cima da minha mesa na busca do pisca-pisca da banda
larga.
Um pouco decepcionada e
ansiosa, conectei com paciência os meus laços com a vida, parecendo inútil me
apartar dela e de todo resto.