Despertavam os dois, um em cada canto da vida
parecendo a um e outro que de longe se enxergavam e muito perto estavam, porém,
ao esticarem os olhos para verem-se e suas mãos se tocarem sofregamente, a
imagem sumia de repente, parecendo que havia sido um sonho, uma miragem ou
apenas um desejo senil de outros tempos. Mas, para aquelas almas perdidas, não
era.
A moça era esfuziante e, muito mais do que
bonita, o impulso e a mocidade lhe davam a garantia de levantar todo o dia com
energia para dar, vender, estocar, emprestar e o que mais não seja quando se
tem 25 anos. Na cabeça o dia que vinha
pela frente como se fosse uma gincana fácil de lidar, uma corrida de obstáculos
que lhe sobravam pernas, um tempo que voava e assim ela alegremente corria
atrás sobrando muito e mais um pouco do que a vida lhe dava diariamente. Bons
tempos em que as horas passavam com a parcimônia de um funeral, não queimando
etapas, não passando por cima de nada nem ninguém no final restando um suspiro
de amor a ser abafado entre travesseiros. Talvez um tímido amor que lhe batia à
porta, mas, por algo insuspeito não conseguia adentrar nesta alma inquieta.
Não se tem boa lembrança de como os encontros
aconteciam, de como se chegava na hora certa na porta da amada, no restaurante,
na praça ou no cinema combinados, na verdade pensando em dias de hoje, acredito
que havia certa telepatia que corria solta entre os seres que queriam se
encontrar, ficar juntos por um tempo ou muito, que desejam trocar juras em uma
praia deserta, que almejavam todo o dia sair para se divertir. Certamente foi
esta época de ouro em que a combinação vinha de um diretamente ao coração do
outro, como flechada envenenada e certeira. Parece-me, hoje, que este –
interlúdio – foi marcado por um tempo em que tínhamos o poder das horas, dias e
noites e muito ainda sobrava para sonhar, divagar, ficar inseguro quanto a
reciprocidade do ser amado, querido ou paquerado, digamos assim.
E assim, nesta vida que corria solta o
encontro foi marcado pela vida, bem longe das paragens daqueles dois
predestinados que puderam ter em poucos dias uma convivência idílica muito por
conta de paisagens dos vários lugares visitados do que propriamente do seu
lugar de origem. Ingrediente exato para uma receita de bolo de amor perfeita:
estar longe da rotina, acordar todos os dias vislumbrando o que de melhor
nossos olhos pudessem obter, passar horas de riso fácil, sorriso escancarado,
noites quentes, drinks exóticos e muita companhia interessante, mas com o olho
sempre “virado” para “ele” e “ela”. Em meio ao tumulto das festas o cupido não
perdia tempo e deixava insone aqueles dois. De um lado certo preciosismo e de
outro uma tagarelice de verão. Tudo junto.
E foi deste jeito que os encontros retomaram
um ritmo próprio, mas ainda distante geograficamente, o que espanta pela
assiduidade em vários locais de interesse comum tanto para conversas
infindáveis quanto para apenas usufruir a companhia um de outro. Os dois estavam
enredados na trama suja de um destino qualquer assim ocorrendo o inesperado.
O
Cupido, até então atento, fazendo as ligações com perfeição deu uma olhada para
um lado, se distraiu e se perdeu daqueles dois. Como era uma época de
comunicação diferente se distanciaram os dois de uma hora para outra sem que
até hoje nenhum dos dois lembre direito a razão. O tempo parece ter voado desde
então nas “Asas da Panair”. O Cupido,
amigo deles, envelheceu e se encheu de culpa ficando agora de plantão na
Rodoviária na espreita de finalizar um encontro que sempre esteve separado pela
Geografia. Ou não?