Os ouvidos parecem não se cansar de ter de ouvir a
conversa desavisada que sempre vem em momentos inesperados, quando se é
arrastado para um caminho desconhecido ou quando quem fala conversa para si,
como se quisesse afirmar a ele próprio aquela falta de tato, aquele mau gosto
exasperado de contar o que não diz respeito a ninguém, nem a ele próprio.
O despreparo e a surpresa são sempre iguais porque parece
impossível que a contagem de dados estúpidos seja derrubada boca afora sem
filtro, sem tranca e sem pudor. O “ó” da boca entreaberta para pedir caluda
fica no ar, a respiração passa a ser por ali uma vez que será difícil fechá-la
tal o espanto desavergonhado de engolir um diálogo sobranceiro que envolve uma
narrativa sem propósito de conteúdo.
Deve ser a sina de quem aprendeu a ouvir mais do que
falar, a enxergar ao invés de ver, a sentir ao invés de demonstrar, a abster-se
de opinar, a manter-se de lado no julgar do diálogo e a pensar com mais vagar. Esta é a maldição à trava na língua e a incapacidade
de fugir do mau assunto e relegar a massa cinzenta a remoeção dos dados
enxertados à força pelo momento. Ser levado sem consulta e aviso prévio à
intimidade de quem quer que seja, carece de sentido, demonstra falta de tato e
gera um arrasto de impossibilidades no pretenso diálogo que, aliás, não
acontece deveras.
O término do solitário e
surreal passeio verborrágico é singular e abrupto e assim se inicia o movimento
pela retomada da linha enovelada inicial e, desta forma, todos os fios
desencapados do raciocínio lógico se restauram como se fosse mágica. A cabeça
se refresca, a musculatura se solta e a mente ensaia uma oração: que estes
ventos letrados ao contrário não tenham mais tamanha envergadura no futuro e
que não atinja quem prefere calar.