
Morrer é solene e a morte é imperativa. Não tem nada mais definitivo e mais incerto em nossa vida.
Sempre, sem acreditarmos que a hora vai chegar, aparece o velório daquela pessoa querida, parente, pai ou mãe e vais te ver diante da cerimônia, em que a despedida é a última.
É para nunca mais.
A cena, muitas vezes é insólita, pois entramos no túnel do tempo. A vida tratou de dar um soprão em todas as pessoas da cidade natal e de repente todas elas, do teu passado, retornam, como gentis fantasmas sorridentes te espreitando, te olhando, para confirmar se você é você mesma.
É neste momento que o funeral se torna uma cerimônia linda, única, entremeada de abraços e como vais, há quanto tempo, enquanto a alma do morto paira sorridente sobre o grupo, pois foi desta terra nascido e por ali viveu sendo respeitado e querido...apenas o destino o levou para outros cantos, mas sua alma mora ali, naquela cidade. É para ela que ele quer voltar.
As raízes afloram nesta hora, todos entram nos trilhos do passado e aproveitam a viagem que vai se tornando íntima e lúdica. As primas e primos, parentes e amigos que há muito não se vêem e que precisaram de reforço ocular para ter certeza de quem é este ou aquele, agora identificados, soltam a conversa.
O funeral vira uma grande e emotiva reunião onde todos se conhecem e se estranham porque já foram íntimos, e há muito, não o são.
Amigos de infância que juntos, têm as melhores recordações de criança parecem querer voltar no tempo, já começam a sorrir e se falar do mesmo jeito de 40 anos atrás ou mais.
O passado impera na cerimônia.
A alma do velado continua serena, pois afinal, em sua despedida, todos estão reunidos. Que honra.
E ele parte. Agora, para sempre. Regressa à sua terra.
À beira do túmulo, agora fechado e cheio de vivas flores e homenagens o grupo se alvoroça, é chegada a hora de voltar ao agora. Em círculos, as pessoas se misturam, andam erráticas e não sabem como se sai de lá.
A viagem de volta ao passado tem que terminar ali. Abraços de um e outro e quando se vê, se está abraçando e se despedindo pela terceira vez a mesma criatura e o grupo se alterna em círculos cada vez mais fechado e mais difícil de dissolver.
Enfim, se rompe o laço. Não tem jeito. É hora de voltar a viver a vida.
Até a morte.